Domingo
no Circo
Resolveu
levar o neto ao circo, para que conhecesse a alegria pura e inocente, como
aquela que tinha vivido na sua infância. A expectativa de ambos era enorme.
Chegando
ao local quis comprar pipoca, mas foi informado que não era mais
comercializada, pois a ANVISA não permitia a venda de alimentos com gordura
trans. Também não encontrou algodão doce, pois a SMIC não liberara a carrocinha
de venda da guloseima.
As
frustrações estavam apenas começando.
Foi
até a bilheteria e soube que não haveria espetáculo, o vendedor de ingressos
começou a enumerar os motivos:
A
bandinha fora proibida de tocar, pois deveria recolher uma taxa para o ECAD. O
elefante fora afastado por ordem do IBAMA. O domador do leão havia ingressado
com uma reclamatória trabalhista, alegando periculosidade. O picadeiro não
podia ser montado, pois faltava areia, proibida pela FEPAM, e a serragem não
era certificada, podendo configurar risco ambiental. O trapézio havia sido
interditado pelo MPT, pois poderia oferecer risco aos acrobatas. A mulher
barbada e o palhaço anão estavam processando o dono do circo por bullying,
alegando dano moral. O mágico não poderia se apresentar, pois o PROCON
entendia que o ilusionismo era uma forma de enganar o consumidor. O
encarregado da limpeza forçou sua demissão para ficar no seguro desemprego. O
engolidor de fogo não obteve PPCI do Corpo de Bombeiros para apresentar seu
número. As duas ginastas oficializaram sua união e abandonaram o circo. As motocicletas
do Globo da Morte foram apreendidas pela EPTC, pois estavam com a surdina
incompleta. O equilibrista foi vetado pela DRT, pois não usava paraquedas. O
fornecimento de energia foi cortado, pois o circo deveria instalar uma
subestação, às suas expensas, para recebê-la. O homem bala não poderia ser
arremessado pelo canhão, pois a arma não estava registrada na Polícia Federal.
O apresentador era estrangeiro e não podia trabalhar, pois não era cubano. Os
macacos estavam proibidos de atuar, por força de uma Ação Coletiva de uma ONG
Darwinista. Foi ajuizada uma ACP pedindo a interdição do circo. Houve uma
autuação fiscal cobrando ISS, o contador ficou com stress e entrou em licença
saúde.
O
dono do circo, que era o verdadeiro malabarista, pois tinha de pagar todos os
impostos com uma receita insuficiente, tinha entrado em depressão.
Sentado
num tamborete, viram um homem triste, com o rosto pintado e vestido de palhaço.
Então
o menino perguntou:
“Vô,
mas o palhaço não é alegre?”
E
ele respondeu:
“Pois
é, levaram embora a alegria dele. Acho que vais ter que voltar a brincar com
teus videogames ou assistir desenhos na TV”.
Leo Iolovitch