Desigual
A igualdade não é um
direito – é o resultado
do que o cidadão aprendeu
Vamos combinar uma coisa,
desde já: ainda não foi inventada neste mundo uma maneira mais eficaz de
concentrar renda, preservar a pobreza e promover a desigualdade do que negar ao
povo jovem uma educação decente – apenas decente, só isso. Vamos combinar mais
uma coisa: só há uma chance na vida de adquirir os conhecimentos básicos para a
melhoria da condição social de quem nasceu pobre, e essa chance é a escola
básica.
Se for perdida, ela não
volta nunca mais; é perfeitamente inútil ficar falando em “resgate da pobreza”,
“ascensão social”, “mais igualdade” e outros requisitos para um “mundo mais
justo” depois que o garoto saiu da escola e não aprendeu o que deveria ter
aprendido. Não é preciso ser nenhuma Finlândia, Cingapura e outros parques
temáticos sociais que enfeitam nosso planeta. Basta o cidadão aprender o
suficiente para fazer as operações essenciais da matemática, distinguir física
de química e entender o que leu numa página escrita em linguagem corrente.
Há um acordo geral sobre
essas realidades? Se houver, é bom já ir se acostumando com o seguinte fato:
praticamente todas as ideias que circulam por aí para melhorar o Brasil são a
mais pura e lamentável perda de tempo.
O que adianta esquentar a
cabeça discutindo se o deputado Rodrigo Maia vai salvar a República dos perigos
da “polarização”? Ou se os gigantes da nossa “engenharia política”, seja isso
lá o que for, vão bater um suco de Lula com Luciano Huck, misturar tudo o que
há no meio, e tirar daí o segredo do
centro-esquerda-moderado-sociológico-popular que vai levar os 200 milhões de
brasileiros direto para o céu? Adianta três vezes zero.
Não vai adiantar nunca,
quando ninguém mais se lembra, entre todos os condes e viscondes da política e
das classes intelectuais deste País, da calamidade social que nos foi anunciada
há menos de uma semana. Que calamidade? Coisa simples: na última e mais respeitada
avaliação da qualidade da educação no mundo, feita em 2018 em 79 países, o
Brasil ficou entre os 20 piores. Nossos jovens, para resumir a ópera, não sabem
nada de matemática, ciências e leitura – ou nada que preste para alguma coisa
realmente útil. Não há horizonte viável num país assim, é claro. Mas como
ninguém está ligando, é assim que o País vai continuar.
Mudar como, se a elite que
se diz responsável, pensante e equilibrada continua achando que o grande
problema da educação no Brasil é o ministro Weintraub? Que diabo ele tem a ver
com o desastre dos últimos 30 ou 40 anos – mesmo que seja o pior ministro de
Educação do mundo?
Vamos continuar nos
queixando, nas mesas-redondas de televisão e nas palestras para empresários,
que o Brasil é um país injusto, que temos de “distribuir renda”, que é preciso
dialogar com as “comunidades”, etc. etc – mas ninguém quer ensinar a moçada a
somar fração, perceber o que é um átomo ou entender o que está escrito num
texto de quinze linhas, mesmo porque há uma multidão que não sabe escrever um
texto de quinze linhas.
É inútil, como fazem nove
entre dez políticos, comunicadores e cientistas sociais, querer que as pessoas
tenham igualdade nos resultados quando não são iguais nos méritos. Não há como
ser igual nos méritos, ao mesmo tempo, se o sujeito que sabe menos não teve
oportunidades iguais de aprender as coisas que foram aprendidas pelo sujeito
que sabe mais.
É tolo supor que quem sabe
menos pode ganhar o mesmo que quem sabe mais, ou ter as mesmas recompensas na
vida – tão tolo como achar que você vai ser contratado pelo Real Madrid porque
joga futebol com a turma do prédio. A igualdade não é um direito – é o
resultado do que o cidadão aprendeu. Não há “políticas públicas”, nem “vontade
política”, que possam resolver isso.
J R Guzzo
Estadão – 08.12.2019
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