O ministro do Supremo
Tribunal Federal (STF) Luiz Fux recuou mais uma vez em uma liminar concedida
por ele mesmo. No fim de novembro, ele havia derrubado sua própria decisão
monocrática a respeito do auxílio-moradia do Judiciário, como parte da
negociata que envolveu o reajuste dos ministros do STF. Agora, ele levou bem
menos que quatro anos para reverter sua opinião: atendendo a um pedido da
Advocacia-Geral da União, Fux revogou liminar concedida na semana passada e que
suspendia a aplicação de multas por descumprimento da tabela de frete imposta
pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
O tabelamento do frete era
uma reivindicação dos caminhoneiros que haviam parado o Brasil em maio, em um
protesto que até contou com o apoio da população em um momento inicial, mas
depois se revelou puramente corporativista, preocupado apenas com as próprias
questões. O tabelamento serviu aos caminhoneiros, mas prejudicou todo o resto
do país ao inflacionar o preço do transporte rodoviário, o que teve seu reflexo
no desempenho do setor produtivo, nos preços praticados ao consumidor e até no
comércio exterior. A suspensão da multa por Fux, na semana passada, irritou a
categoria, que ameaçou parar novamente. Isso só não ocorreu porque a AGU já
havia se comprometido a intervir, e o pedido feito ao STF mostra o nível da chantagem
dos caminhoneiros. Era preciso voltar a aplicar as multas para “evitar risco de
comprometimento do sistema de distribuição de alimentos, medicamentos,
combustíveis e outros produtos essenciais [...] no período do Natal e do Ano
Novo”, afirmava a AGU. Ou seja, os caminhoneiros estavam dispostos a, mais uma
vez, prejudicar toda a nação nas festas de fim de ano, quando a demanda por
vários itens, como combustíveis e alimentos, tende a crescer.
O argumento de que seria
melhor esperar a mudança de governo para se resolver a questão, usado pela AGU
e aceito por Fux, também não para em pé. Isso porque, desde a publicação da
medida provisória (depois convertida em lei) que autorizava a ANTT a publicar a
tabela, o que o setor produtivo vem questionando é a constitucionalidade desse
tabelamento. É algo que tem de ser resolvido não pelo Executivo, nem pelo
Legislativo, mas pelo Judiciário, que não muda em 2019. E não apenas a
inconstitucionalidade do tabelamento é evidente, violando os artigos da Carta
Magna que protegem a livre iniciativa, como também o assunto é urgente, dadas
as perdas do setor produtivo com a política que aumentou os preços mínimos do
transporte.
Se chegamos à situação em
que os caminhoneiros se colocam mais uma vez na posição de chantagear o país,
isso ocorre em grande parte graças à omissão do Supremo, especialmente a do
ministro Fux. Foi ele quem, em junho, paralisou todas as ações judiciais a
respeito do frete e, depois, passou meses sem tomar uma decisão. Quando o fez,
suspendendo as multas, não atacou a questão central, que já tinha delegado ao
plenário do STF – no entanto, o tema nunca chegou a ser pautado para análise da
corte. Agora, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) pedirá
ao STF que analise o tema antes do recesso judiciário de fim de ano. Se isso
não ocorrer, o Supremo estará colaborando para a continuação da insegurança
jurídica em torno do assunto.
Mas também o Poder
Executivo mostra sua leniência diante da atitude dos caminhoneiros. A AGU não
apenas atuou para perpetuar uma inconstitucionalidade, mas também se curvou aos
que estavam dispostos a violar direitos fundamentais da população, como o de ir
e vir. O governo, em vez de deixar claro que não toleraria novos bloqueios de
estradas nem o desabastecimento de produtos básicos, se transformou em refém
dos caminhoneiros por vontade própria, incentivando ilegalidades e tolerando o
intolerável.
Gazeta do Povo
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