Eliane Cantanhêde
Nós, mulheres, costumamos
ser menos afoitas, mais desconfiadas, demoramos mais a tomar decisões.
Estereótipo? Sei lá. O fato é que o eleitorado em geral já está em cima do
muro, mas o feminino, que é a maioria (52,5%), está mais ainda. Indeciso ou
decidido a votar branco ou nulo. Acordem, candidatos e candidatas!
Pesquisa Datafolha de
junho mostra que a soma entre as indecisas (54%) e as que pretendem anular o
voto (26%) chega a chocantes 80%, o maior índice na comparação com eleições
anteriores nesta mesma época da campanha. A mulherada anda braba, ou descrente
de tudo.
Até Jair Bolsonaro, com
8,5 milhões de seguidores no Twitter, Facebook, Instagram e YouTube, não
conquista a eleitora com a mesma eficiência, ou na mesma proporção, com que
atinge o eleitor. A desproporção é grande.
Aí começam as ideias
mirabolantes e os jeitinhos de última hora, principalmente na escolha dos vices
nas chapas. Ciro Gomes, por exemplo, acena com 50% dos ministérios para
mulheres. Bolsonaro foca na advogada e professora Janaína Paschoal que, como
ele, nunca gerenciou coisa nenhuma. Geraldo Alckmin namora a ideia da deputada
Tereza Cristina, que é do DEM e preside a Frente Parlamentar da Agropecuária. E
já venderam a ele até a opção pela vice-governadora do Piauí, Margarete Coelho.
Marina Silva é a única, no
pelotão de frente, com uma porcentagem maior de apoios no eleitorado feminino
do que no masculino, na base de 17% para 12%. Além de ser mulher, Marina tem um
discurso que sensibiliza naturalmente a média das mulheres, pela seriedade,
pela crítica à “velha política”, pelo esforço para fazer “diferente”.
Em São Paulo, o candidato
do MDB ao Palácio dos Bandeirantes, Paulo Skaf, caprichou e uniu o útil ao
agradável. Sua vice, Carla Danielle Basson, além de mulher, é tenente-coronel
da PM paulista. Como se sabe, a crise na segurança pública é um problemaço de
Norte a Sul do País.
Uma enquete do
jornal O Globo, porém, mostra que a maior preocupação das mulheres nem é a
questão gravíssima da segurança pública, mas a saúde, que pode traçar ainda
mais diretamente o limite entre a vida e a morte. Nós, mulheres, temos
aparentemente mais responsabilidade pelos pais e mães muitas vezes idosos,
pelos filhos pequenos, jovens ou adultos, pelos maridos sempre mais refratários
a procurar médicos e hospitais.
Imagine-se o imenso
universo de mulheres pobres, as trabalhadoras de classe média baixa, que se vêm
às voltas com as condições precárias e assustadoras dos serviços públicos de
saúde no Norte, no Nordeste, no Sudeste, no Sul, no Centro-Oeste? O que os
senhores e senhoras candidatos podem dizer a elas sobre programas factíveis
para atacar essa calamidade?
Outra questão tóxica, da
qual candidatos e candidatas fogem desde sempre como diabos da cruz, é a da
descriminalização do aborto. Nesta semana mesmo, o Supremo Tribunal Federal
abre uma audiência pública com profissionais da área médica, representantes de
igrejas e experts de diferentes setores sobre a descriminalização do aborto até
12 semanas de gestação.
A ideia não é estimular o
aborto, é acabar com uma realidade social injusta, e aí, sim, criminosa.
Fecham-se os olhos para as mulheres ricas que fazem aborto em clínicas seguras
e discretas e sai-se prendendo mulheres pobres que arriscam a vida e a saúde em
pocilgas infectas e ainda são punidas pela lei.
Como a reforma da
Previdência, essa é uma discussão internacional, mas não prospera no Brasil por
falta de ambiente e de coragem. Com eleitoras engajadas e com candidatos e
candidatas comprometidos realmente com direitos e o bem público, quem sabe se
possa falar, ouvir e decidir com o coração e a razão?
Portal Estadão, em
31/07/2018
Nenhum comentário:
Postar um comentário