Samba do País doido*
Áudios do Joesley, recibos do Lula, jeitinho brasileiro
no STF,
pesquisas hilárias. É pra rir ou pra chorar?
Eliane Cantanhêde
O que está acontecendo no Brasil é o samba do País doido,
em que as coisas mais inacreditáveis acontecem não uma ou duas vezes, mas aos
borbotões, uma atrás da outra, todo santo dia. Quando a gente acha que não pode
piorar, que é impossível surgir algo ainda mais inverossímil, pode ter certeza:
piora e lá vem a nova bomba, uma mais chocante do que a outra. Isso tudo gera
perplexidade, irritação, desânimo.
As gravações com Joesley Batista, por exemplo, são um
mistério com várias explicações, nenhuma delas convincente. Alguém aí grava sem
querer uma conversa mais do que comprometedora com um braço direito, um sócio,
um parente? Ou grava, também sem querer, uma troca de informações com
advogados, dentro de um carro fechado com cinco pessoas?
Mas Joesley, que pode ser tudo, menos bobo, deixa um
gravador ligado e sai falando cobras e lagartos de procuradores, políticos,
ex-ministros e até ministros do Supremo com Ricardo Saud. E ele, ou alguém,
também grava o papo dele com sua advogada, o diretor jurídico da JBS e o
onipresente Saud justamente depois de uma reunião na PGR. Foi o mordomo? E o
motorista?
O mais fantástico é que os áudios foram parar na boca do
leão, ou seja, na PF, no MP, no STF e, no final das contas, nas revistas,
jornais, rádios e na televisão. Tudo por acaso, por descuido? O tal Joesley,
espertíssimo ao comprar políticos, ficar íntimo do governo Lula e rapar o tacho
no BNDES, é um boboca, quase idiota, ao se deixar gravar assim?
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Inverossímil também é o pastelão em torno do apartamento
vizinho ao do ex-presidente Lula em São Bernardo. Por coincidência (como as
gravações do Joesley...), o primo do pecuarista José Carlos Bumlai compra o
imóvel exatamente ali, cara a cara com Lula. Depois, esse primo diz em juízo
que nunca recebeu nada da família que o usava. Lula rebate dizendo que pagava,
sim, senhor. No disse que disse, surgem recibos salvadores. E que recibos!
Não foram reconhecidos em cartório. Continham dois dias
inexistentes no calendário, 31 de junho e 31 de novembro. Foram assinados com
datas variadas, mas num único dia, e num hospital. Segundo o proprietário, a
pedido do advogado Roberto Teixeira, que cuida das moradias de Lula há umas
três décadas. E o mais macabro: em nome de Dona Marisa Letícia, a mulher de
Lula, que morreu em fevereiro.
O STF e o Congresso já andavam se estranhando, com buscas
e apreensões em gabinetes de senadores e a canetada do ministro Marco Aurélio
para derrubar o réu Renan Calheiros da presidência do Senado. Mas a coisa
piorou muito quando a Primeira Turma criou uma figura curiosa, a do
“recolhimento noturno” do senador tucano Aécio Neves. Foi o “jeitinho
jurídico”, ou o “jeitinho brasileiro”, para o STF prender Aécio sem admitir
estar prendendo.
Os ministros do STF passaram a bater cabeça, não em
“casa”, mas em público. Cada um fala o que bem entende, expondo as
idiossincrasias internas a céu aberto. Fux, Barroso, Marco Aurélio e Gilmar,
ora, ora, todos falam, enquanto Cármen Lúcia tenta acertar os ponteiros com o
presidente do Senado, Eunício Oliveira. Esses meninos, ops!, esses ministros
dão um trabalho!
Todas essas confusões refletem em resultados
contraditórios nas pesquisas. Pelo Datafolha, Lula continua líder isolado para
2018, mas mais da metade dos entrevistados quer a prisão dele. E a grande
maioria, numa resposta, defende que o processo contra o presidente Temer
continue, mas, em outra, que ele conclua o mandato. O samba da pesquisa doida.
É para rir ou para chorar?
Ideia de jerico. Juntar todos os chefões do tráfico
novamente no Rio? Só pode ser brincadeira!
*Postado no Portal Estadão em 03/10/2017
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