É duro voltar*
Olhar o Brasil de fora causa perplexidade e uma tristeza sem
fim
Eliane Cantanhêde
Acompanhar de longe as notícias sobre o Brasil é um
exercício complexo e deixa qualquer um numa tristeza sem fim. Um País tão
lindo, tão diversificado, cheio de potencialidades, mas atolado numa corrupção
gigantesca, numa desigualdade feroz e numa violência urbana sem paralelos,
girando em círculos, sem saída. De dia é pânico, de noite é rock and roll. Mas
o pânico fica, o rock acaba.
O bom da história é que a economia vem aos poucos se
descolando do descalabro na política e tentar entender essa bifurcação é um
desafio e tanto, até mesmo para os experts. Só não é difícil imaginar como está
o clima no governo, particularmente no Planalto, com o presidente Michel Temer
novamente no foco.
As manchetes políticas não são apenas devastadoras como
abafam os bons resultados na economia que pipocam daqui e dali. Temer é alvo do
segundo processo e de delações premiadas que vão sendo estrategicamente
divulgadas. É Petrobrás, é Furnas, é CEF. Como destacar boas novas?
Os juros continuam caindo. A inflação persiste abaixo da
meta. Há recuperação de empregos com carteira assinada pelo quinto mês
consecutivo. E, apesar do recuo de ontem, a Bolsa bate recordes. Nesse cenário,
a previsão de crescimento melhora (ou deixa de ser tão aterrorizante). Mas e
daí?
Daí que Temer voltou às manchetes policiais e à chantagem
do Congresso num processo de resultado previsível, enquanto o ministro Henrique
Meirelles finge que não tem nada a ver com isso e tenta colar sua campanha para
a Presidência em 2018 à recuperação da economia.
Logo, a política traga Temer por um lado, a economia
impulsiona Meirelles pelo outro, mas é preciso cautela para avaliar suas
chances. Eles gostariam que a economia levantasse o presidente e os problemas
políticos não atingissem o ministro e dá-se o contrário: a economia não
beneficia o presidente e a impopularidade do governo tende a atrapalhar o
ministro.
De toda forma, Meirelles voltou ao Brasil, entrou na
política e aceitou os cargos que aceitou porque só pensa em ser presidente; o
tabuleiro de 2018 está tão aberto que qualquer um se julga com direito de se
lançar (até apresentadoras de TV?!); a economia pode se transformar num bom
cabo eleitoral.
Longe ou perto das notícias, portanto, é possível
entender o movimento de Meirelles, o que é incompreensível é Lula atingir o
número cabalístico de sete inquéritos e não só manter como recuperar
seguidores, enquanto o juiz Sérgio Moro faz o percurso inverso.
Mas, do outro lado do Atlântico, os dois grandes impactos
são o turismo e a segurança, que, aliás, têm relação direta de causa e efeito.
Onde você vai na Itália, em Portugal, na Croácia, na linda Eslovênia ou na
sofrida Bósnia, há sempre uma multidão incrível de turistas de todas as partes
e, claro, levas e levas de brasileiros, gerando empregos e desenvolvimento. Há
cidades que, sozinhas, recebem mais turistas do que o Brasil inteiro.
A sensação de segurança é até estranha. Você não acha que
vai ser assaltado na primeira esquina, não enxerga no rapaz ali parado um
ladrão pronto para dar o bote, muito menos passa pela sua cabeça que vão te
cortar a garganta ou dar um tiro à queima-roupa para roubar sua carteira. E
ainda se tem de ouvir o taxista português contando o trauma da família depois
do arrastão contra a excursão da sua irmã a Porto de Galinhas...
Nas eleições de 2018, a prioridade será não roubar, não
deixar roubar e recuperar desenvolvimento e empregos, mas vai entrar para a
história quem combater decisivamente a facilidade com que se assalta e se mata
em qualquer região, cidade ou rua. O Brasil está doente. Sair de férias é
ótimo, duro é voltar.
*Publicado no Portal Estadão em 26/09/2017
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