Sentimento de impunidade ainda estimula corrupção*
Prisão de Geddel Vieira, por tentar obstruir a ação da
Justiça,
é uma das provas de que investigados por corrupção não se atemorizam
diante dos organismos de Estado
Desde o começo das investigações do mensalão, em 2005,
passando pela condenação de mensaleiros, em 2012, e chegando à Lava-Jato,
lançada em 2014, passaram-se 12 anos e mesmo assim poderosos ainda continuam a
ser presos em nítido delito. Mesmo que haja correntes que considerem parcelas
do Ministério Público e do Judiciário, envolvidas neste enfrentamento da
corrupção, a reencarnação dos radicais jacobinos da Revolução Francesa e suas
guilhotinas, ou a ressurreição de Torquemada, o frade da Inquisição espanhola
responsável por despachar para sessões de tortura e fogueiras, alegadamente
purificadoras, hereges, judeus, homossexuais et
Se eles espalharam o terror na França do final do Século
XVIII e na Espanha medieval, no Brasil dos tempos que correm não assustam
denunciados por corrupção. O ex-ministro Geddel Vieira é o mais recente exemplo
em pessoa de que, apesar de denúncias de que agentes públicos perseguiriam
suspeitos por sobre leis e a Constituição, os tais perseguidos não demonstram
qualquer pudor em continuar na delinquência.
Geddel foi preso segunda-feira, por determinação da
Justiça, a pedido do Ministério Público e da Polícia Federal, acusado de
pressionar a mulher de Lúcio Funaro, Raquel, para que sondasse o marido, preso,
sobre a intenção dele de fazer acordo de delação premiada com o MP. Manobra com
o objetivo evidente de criar obstrução à Justiça. Outro motivo de preocupação
de Geddel era, e é, o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha, também
trancafiado. Temer concorda, a julgar pela gravação de Joesley Batista.
O motivo é que Geddel, segundo denúncias, se beneficiou
de um esquema montado por Eduardo Cunha, com o aval da presidente Dilma
Rousseff, na área do fundo de investimentos do FGTS, na Caixa Econômica, para
cobrar propinas de empresários, um dinheiro a ser gerenciado pelo operador
Funaro.
Cabe registrar que Geddel ostentava esta desenvoltura
para erguer obstáculos às investigações mesmo depois de o presidente Temer ser
obrigado a afastá-lo da Secretaria de Governo quando o colega de Ministério,
Marcelo Calero, da Cultura, o denunciou por fazer forte pressão para que o
Iphan, da jurisdição de Calero, licenciasse um prédio em área preservada em
Salvador. Nele, Geddel adquirira um imóvel. Nenhuma sanha persecutória de
procuradores ou policiais federais o demoveu de nada.
Os lulopetistas também não se atemorizaram com a
descoberta do mensalão, nem com a Lava-jato em seu início. José Dirceu, por
exemplo, preso na Papuda, cumprindo pena de mensaleiro condenado, continuou a
receber propina do petrolão.
Constata-se, portanto, que denúncias contra agentes
públicos em ações contra a corrupção têm mais de tática de advogados de defesa
do que de substância efetiva. O sentimento de impunidade continua presente.
*Publicado no Portal O Globo em 05/07/2017
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