Temer tenta adiar desfecho e renúncia pode ser inevitável
Vera Magalhães
O pronunciamento do presidente Michel Temer foi uma
tentativa de ganhar tempo, mas o tom taxativo que ele tentou empregar à fala
não eliminou a falta de sustentação política instantânea que atingiu o governo
depois da revelação das primeiras informações das delações de Joesley Batista e
demais colaboradores do grupo JBS.
Temer apostou na divulgação dos áudios da conversa
gravada por Joesley com ele para tentar negar que tenha avalizado o pagamento
de mesada a Eduardo Cunha ou indicado o deputado e ex-assessor Rodrigo Rocha
Loures como intermediário para a negociação de interesses da holding mediante
pagamento de propina.
De fato, a transcrição do áudio é menos literal do que o
divulgado inicialmente quanto ao suposto aval de Temer ao pagamento para calar
Cunha mesmo depois de preso.
A frase de Temer – “Tem de manter isso, viu?” – é dita
depois de Joesley relatar que está se “dando bem” com Cunha. A má qualidade da
gravação não permite afirmar com certeza que Temer sabia que se tratava de
pagamento. A falta de um vídeo impede saber se houve algum gesto indicando
pagamento e uma frase do peemedebista é inaudível.
Parte inferior do formulário
Ainda assim, o conjunto da conversa é gravíssimo e
avassalador para o presidente. Ele ouve o empresário relatar crimes em série,
como o pagamento de propina a um procurador da República para obstruir
investigações, ou o “controle” de dois juízes com o mesmo fim, e nem sequer o
admoesta. Também não toma providências posteriores. No mínimo, cometeu o crime
de prevaricação.
Há que se analisar, ainda, o resto do conjunto probatório
de posse do STF, no qual se baseou o ministro Edson Fachin para deferir a
abertura de inquérito contra o presidente.
O flagrante de recebimento de propina por Rodrigo Rocha
Loures depois de ter sido designado por Temer como interlocutor é igualmente
letal para o presidente.
Temer adiou a renúncia, mas os desdobramentos da delação
podem torná-la inexorável em poucas horas. Ele até pode refutar a literalidade
das gravações, mas o derretimento político do governo não depende mais disso.
*Publicado no Portal Estadão em 19/05/2017
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