Agora, Renan Calheiros*
Eduardo Cunha já se foi – se não definitivamente, pelo
menos por prazo indefinido – e Dilma Rousseff tem encontro marcado com seu impeachment
no próximo dia 11. Mas a faxina nos mais altos escalões da República, imposta
pela necessidade de reescrever a triste história do populismo ancorado na
corrupção que o País viveu nos últimos 13 anos, exige ainda outra medida
essencial: o afastamento de Renan Calheiros da presidência do Senado Federal.
Vale para o político que comanda a Câmara Alta o mesmíssimo argumento
apresentado pelo ministro Teori Zavascki ao justificar a suspensão do exercício
do mandato de deputado de Eduardo Cunha e, consequentemente, seu afastamento da
presidência da Câmara: “Nada, absolutamente nada, se pode extrair da
Constituição que possa, minimamente, justificar a sua permanência no exercício
dessas elevadas funções públicas”. Funções que incluem a eventual e temporária
substituição do presidente da República.
O senador Renan Calheiros, em quem cai como uma luva a
definição pejorativa de “político profissional”, aliou-se a todos os governos
pós-redemocratização e está hoje envolvido até o pescoço nas investigações da Lava
Jato, relativas ao escândalo da Petrobrás e conexos. Aparece como investigado e
acusado em delações premiadas em nada menos do que nove inquéritos. E é
investigado também em um inquérito da Operação Zelotes, que trata de suspeitas
de corrupção no âmbito da Receita Federal. No total, o senador responde a 12
inquéritos junto ao STF, 9 dos quais da Lava Jato. A diferença em relação a
Eduardo Cunha é que Calheiros, pelo menos por enquanto, não é réu em nenhum
desses processos. No máximo, teve a quebra de seu sigilo bancário e fiscal
autorizada por Zavascki, em dezembro do ano passado.
Mas as peripécias de Renan Calheiros à sombra do poder,
que chamam a atenção da polícia, não se limitam àquelas sob investigação nos
últimos dois anos. Em seu terceiro mandato de senador, o peemedebista alagoano
cumpre também o terceiro de presidente do Senado. Foi obrigado a renunciar ao
segundo mandato de presidente, em outubro de 2007, para evitar a cassação de
seu mandato de senador, depois de o Conselho de Ética ter recebido seis
representações contra ele, envolvendo acusações relativas a delitos de toda
natureza, a começar pelas denúncias, que tiveram ampla repercussão na imprensa,
sobre a propina que recebia da construtora Mendes Júnior na forma de uma mesada
de R$ 12 mil paga à jornalista Mônica Veloso, com a qual tem uma filha.
Pactuou-se escandaloso escambo e o Conselho de Ética absolveu-o de todas as
acusações.
Renan Calheiros não é Eduardo Cunha e a distinção é
evidente quando se comparam os temperamentos e os estilos. Na essência de seu
desempenho político, no entanto, os dois se equiparam, principalmente pela
obstinada ambição de poder, que é sempre ilegítima quando parte do princípio de
que os fins justificam quaisquer meios e, de modo especial, quando esses fins nem
sempre têm algo a ver com o bem comum. E nessa matéria a falta de escrúpulos de
ambos é notória. São dois exemplos, a caminho de se tornarem clássicos, da
vergonhosa subversão de valores que impera hoje na política brasileira, em
grande parte estimulada pelo nefasto populismo lulopetista que, feliz e
finalmente, está sendo desmascarado. Políticos com esse perfil, especialmente
no comando dos Poderes da República, comprometem a credibilidade do governo e
das instituições democráticas, no momento em que, talvez mais do que nunca, o
Brasil precisa de amplo respaldo popular e da confiança de investidores
nacionais e estrangeiros para, com urgência, sair do buraco em que foi metido
pela soberba, ignorância e má-fé dos mercadores de ilusões.
Está mais do que na hora, portanto, de o ministro Teori
Zavascki, apesar de assoberbado pela avalanche de processos da Lava Jato,
encontrar tempo para dar também a Renan Calheiros o que ele merece. Será um
trabalho facilitado pelo fato de que bastará copiar e colar, com o cuidado de
trocar os nomes, amplos trechos do relatório sobre Eduardo Cunha unanimemente
aprovado por seus pares. Afinal, se a exceção excepcionalíssima que os juízes
do Supremo engendraram vale para afastar Eduardo Cunha, também vale para Renan
Calheiros. Só se espera que o excepcional não vire rotina – ou jurisprudência.
*Publicado no Estadão.com em 09/05/2016
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