Terra arrasada*
O governo de Dilma Rousseff é um desastre absoluto,
reconhecido até mesmo pelos petistas mais devotos, mas em pelo menos um aspecto
sua administração vinha primando pela prudência: a presidente não havia
permitido que os tais “movimentos sociais”, grupelhos de oportunistas que se
aproveitam de causas apelativas para sugar recursos do Estado, se
assenhoreassem da administração, como decerto pretendiam. Mas eis que, nos
estertores deste malfadado governo, os tais movimentos já não encontram
resistência. Refestelados no gabinete presidencial, com a sem-cerimônia dos
atrevidos, lá estão a exigir de Dilma cargos, verbas e terras em troca de
apoio, num verdadeiro assalto à estrutura do governo. E Dilma, a dias de ser
afastada do poder, dá sinais de que fará tudo o que eles quiserem, aquiescendo
com uma política de terra arrasada que condiz com a irresponsabilidade
congênita do lulopetismo.
No dia 25 passado, Dilma recebeu em audiência a vanguarda
desses movimentos, a saber: João Pedro Stédile, dirigente do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST); Vagner Freitas, presidente da Central
Única dos Trabalhadores (CUT); e Guilherme Boulos, líder do Movimento dos
Trabalhadores Sem-Teto (MTST). A fina flor dos gaudérios pátrios não estava lá,
é claro, para defender a democracia, pois esta lhe provoca urticária. Estava,
sim, para explorar o fim de feira presidido por Dilma e levá-la a assinar o
papel que lhe puserem na frente.
Na reunião, depois de cumprir a praxe de reivindicar mais
terras e moradias, a tigrada foi ao que interessa: cobrou que Dilma nomeasse
integrantes de sua patota para preencher as vagas de alto escalão abertas na
administração em razão da exoneração dos apadrinhados de deputados que votaram
pelo impeachment.
A exigência já constava de um manifesto lançado pela tal
Frente Brasil Popular, dirigida por MST e CUT, que atuam como braços do PT. Diz
o texto, literalmente: “Demandamos à presidenta da República que prontamente
reorganize seu Ministério, com representantes das forças partidárias e sociais
que conformam a resistência democrática”. O próprio PT, em sua mais recente
resolução, “recomenda à presidenta Dilma Rousseff que proceda imediatamente à
reorganização de seu Ministério, integrando-o com personalidades de relevo e
representantes de agrupamentos claramente comprometidos com a luta
antigolpista, além de incorporar novos representantes da resistência
democrática”.
Ou seja, a chusma de parasitas quer dominar o Ministério
de Dilma e aproveitar os últimos dias em que a caneta da presidente ainda tem
tinta para se banquetear de favores. E Dilma parece disposta a fazer tudo o que
essa turma de ergofóbicos quer, eliminando os últimos vestígios de decência que
restavam em seu governo.
Um exemplo de que a porteira está escancarada foi a
espantosa liberação, em menos de um mês, de 30 processos de demarcação de
terras que eram reivindicadas havia anos por índios e quilombolas. O ministro
da Justiça, Eugênio Aragão, publicou de uma vez cinco portarias declaratórias
em que reconhece terras indígenas cuja extensão supera a das áreas demarcadas
nos últimos cinco anos.
O despautério não vai parar por aí. Dilma mandou espalhar
a informação de que ordenou a seus ministros a implementação do maior número
possível de medidas nesses que devem ser seus últimos momentos na Presidência.
O objetivo, segundo a delirante versão governista, é impedir que o vice Michel
Temer “roube” a autoria dessas medidas quando assumir o lugar de Dilma.
Pode-se
esperar, assim, que a desarrumação atual se aprofunde, pois muitas dessas decisões,
tomadas sem nenhum critério, serão de difícil reversão.
Nessa aventura, Dilma terá a competente ajuda de gente
especializada em confusão e que, sem ter tido um só voto, ganhará poder para
impor aos brasileiros sua agenda demagógica e irresponsável, cujo único
objetivo é estimular a sensação de ruptura, que só interessa aos que fazem
profissão de fé na hostilidade à democracia.
*Publicado no Estadão.com em 28/04/2016
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