Opinião do jornalista Elio Gaspari publicada no jornal O Globo desta quarta-feira, dia 10 de setembro, sobre a delação premiada de Paulo Roberto Costa. Não dá pra não ler!
O anti-Marcos Valério
Elio Gaspari*
O petrocomissário Paulo Roberto Costa
percebeu que arriscava ser condenado a 40 anos de prisão
Paulo
Roberto Costa decidiu não ser o novo Marcos Valério. Decidiu também proteger a
liberdade dos familiares que envolveu em seus negócios. Aos 53 anos, Valério, o
publicitário mineiro celebrizado com o mensalão, foi condenado a 40 anos de
cadeia. Desde o dia 29 de agosto, Costa depõe para o Ministério Público, com
vídeo e áudio, em longas sessões diárias. Durante oito anos ele dirigiu o setor
de abastecimento e refino da Petrobras e a doutora Dilma disse ser
“estarrecedor” que as denúncias e a confissão partam de um “quadro de carreira”
da empresa. É verdade, pois ele entrou para a Petrobras em 1978. Contudo, só
ascendeu à diretoria porque foi indicado pelo deputado José Janene. Depois de
uma militância no malufismo, Janene aliou-se ao PT do Paraná, tornando-se um
dos pilares do mensalão. Isso a doutora sabia. Bastava ler jornal.
Os
procuradores que ouvem Paulo Roberto acautelaram-se para impedir que entregue
pão dormido fingindo colaborar com a investigação. O acervo de informações do
doutor tem três vertentes. Numa, estão suas relações com políticos. Noutra, a
banda das empresas, desde grandes multinacionais que operam no mercado de
petróleo a fornecedores. A lista das empreiteiras, como a dos políticos, é a
dos suspeitos de sempre. Já as companhias de comércio de petróleo formam uma
lista nova, com cifras e nomes. Finalmente, Paulo Roberto Costa e seu cúmplice,
o doleiro Alberto Youssef, deverão mostrar suas contas ao Ministério Público.
Isso será facilitado porque ambos estão presos e Youssef é um veterano
colaborador. Daí poderão surgir os caminhos do dinheiro. As provas, enfim.
Circula
a informação de que, das três vertentes, o Ministério Público concluiu a oitiva
da primeira. Ele pode dizer o que quiser, mas só exercerá o benefício se
produzir provas. Listas de nomes servem para nada. Paulo Roberto Costa é um
homem organizado. Sabe-se desde abril que a Polícia Federal apreendeu em seu
escritório transferências de dinheiro de duas das três maiores tradings de
petróleo e minérios do mundo, a Glencore e a Trafigura. A primeira, uma empresa
anglo-suíça, é maior que a Petrobras. A outra comprou o porto da MMX em
Itaguaí. Nessa papelada, como ocorre há décadas, apareceram pagamentos
suspeitos de eternos fregueses, como a Camargo Corrêa e a OAS. Paulo Roberto
Costa guardava papéis desse tipo no escritório. Talvez tenha mantido um arquivo
eletrônico em lugar seguro, sobretudo quando viu o que sucedeu a Marcos
Valério.
Se
as oitivas do doutor forem profícuas, o escândalo do pretrocomissariado será
duradouro, o maior e mais bem documentado da história nacional. Coisa para
durar anos, estendendo-se à Justiça de outros países. É sempre bom lembrar que
o cartel da Alstom, com suas propinas para tucanos, só andou porque teve a
colaboração e o estímulo do Judiciário suíço. Marc Rich, o fundador da
Glencore, encrencou-se nos Estados Unidos e tomou sentenças que somaram 300
anos de cadeia. Foi perdoado pelos instintos jurídicos e comerciais do
presidente Bill Clinton, no seu último dia de governo. Já a Trafigura foi
condenada por exportar lixo tóxico para a Africa e encrencou-se numa história
de propinas para o secretário-geral do partido do governo em Zâmbia.
Elio Gaspari é jornalista*
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