Por um Brasil de todos
O ESTADO DE S.PAULO*
Campanha eleitoral - e não se trata de outra coisa - é assim
mesmo, quando os poderosos de turno resolvem se beneficiar das fragilidades das
instituições democráticas: vale o que parece, não o que é; importa a versão,
danem-se os fatos. E nessa aventura marota, na qual mergulhou de cabeça para
evitar um desastre para o PT em outubro, Luiz Inácio Lula da Silva é
insuperável. Por isso, não se pode negar razão ao senador Aécio Neves, agora
candidato oficial dos tucanos à Presidência, quando declarou, na segunda-feira
à noite em São Paulo: "Não vamos cair nessa armadilha do debate que
apequena a política, do nós contra eles, da disputa de classes".
A pregação da luta de classes, mote desde sempre das campanhas
eleitorais do PT, desvirtua um dos fundamentos da sociedade democrática, o de
que para se conquistar o bem comum é preciso somar e não dividir. Desde suas
origens políticas na luta sindical, Lula notabilizou-se por "partir para
cima" de seus "inimigos", atacá-los sem trégua, eliminá-los sob
qualquer pretexto. Houve apenas uma ocasião em que mudou de tática: por
recomendação de seus marqueteiros, para consolidar a tendência de vitória nas
eleições de 2002 passou a encenar o "Lulinha paz e amor". Tal como faria
pouco depois, ao renegar, na famosa Carta aos Brasileiros, a pregação
estatizante com que até então combatia a política econômica do governo FHC,
Lula abandonou temporariamente - só temporariamente - sua vocação visceral para
"guerra e ódio".
A mesmíssima prática marqueteira de manipular os fatos para
impor a versão que mais lhe convém Lula adota agora na tentativa de transformar
em limonada o intragável limão da manifestação anti-Dilma ocorrida na Arena
Corinthians. Ninguém provido de um mínimo de sensatez, educação e civismo
aprova o modo grosseiro, com o uso de expressões chulas, com que a presidente
foi ofendida pela multidão.
Feita a ressalva necessária, é preciso também repelir com
veemência a canhestra tentativa lulopetista de apresentar o episódio do
Itaquerão como prova de que Dilma é "vítima das elites".
Absolutamente, não. Registre-se que o ministro Gilberto Carvalho, homem de Lula
dentro do Palácio do Planalto, saiu-se na última quarta-feira com a
aparentemente surpreendente versão de que o episódio do Itaquerão não deve ser
debitado a uma iniciativa da "elite branca" presente no evento, mas é
o resultado da "pancadaria diária" de que o governo e o PT são
vítimas nos meios de comunicação. Trata-se de uma variante tática do jogo
lulopetista, que merece comentário à parte.
O fato é que a contundente manifestação no estádio corintiano
foi o resultado do mesmíssimo sentimento de insatisfação difusa que desde junho
do ano passado tem levado diariamente às ruas brasileiros que, frustrados por
mais de uma década de um ufanismo mirabolante e vazio, começam a se dar conta
de que caíram num enorme conto do Lula. E mesmo que se admita, apenas para
argumentar, que a manifestação anti-Dilma no Itaquerão tenha sido obra
exclusiva da "zelite", esta pode ser condenada por se ter comportado
em relação à chefe do governo do PT exatamente da mesma forma como o PT e seu
governo se comportam em relação a ela, a "elite"? Colhe-se o que se
planta.
De qualquer modo, é profundamente lamentável que, faltando ainda
quase quatro meses para o pleito de outubro, a campanha eleitoral esteja
enveredando pelo descaminho da retórica belicosa com que Lula e o PT pretendem,
em desespero, aprofundar entre os brasileiros a divisão alimentada pelo ódio. E
por essa perspectiva desanimadora é também responsável a oposição, que entra no
jogo do lulopetismo em vez de se concentrar numa campanha propositiva, que
desmistifique, com objetividade e clareza, a empulhação populista de Lula e sua
sucessora, aponte caminhos viáveis para garantir as inegáveis conquistas
sociais e econômicas dos últimos 20 anos e defina uma rota segura para devolver
ao Brasil a certeza de que estará rumando em direção à prosperidade econômica e
à justiça social.
É preciso tirar o ódio do caminho e estimular a cidadania,
valorizar a unidade na diversidade e lutar, com genuíno espírito democrático,
por um Brasil de todos.
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