Documentos inéditos da Petrobras aos quais o jornal
Estado de São Paulo teve acesso mostram que a empresa brasileira abriu mão de
penalidades que exigiriam da Venezuela o pagamento de uma dívida feita pelo
Brasil para o projeto e o começo das obras na refinaria Abreu Lima, em
Pernambuco. O acordo "de camaradas", segundo fontes da estatal, feito
entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-presidente da Venezuela
Hugo Chávez deixou o Brasil com a missão de garantir, sozinho, investimentos de
quase US$ 20 bilhões.
O acordo previa que a
Petrobras teria 60% da Abreu e Lima e a Petróleos de Venezuela SA (PDVSA), 40%.
Os aportes de recursos seriam feitos aos poucos e, caso a Venezuela não pagasse
a sua parte, a Petrobras poderia fazer o investimento e cobrar a dívida com juros,
ou receber em ações da empresa venezuelana, a preços de mercado. Essas
penalidades, no entanto, só valeriam depois de assinado o contrato definitivo,
de acionistas. Elas não chegaram a entrar em vigor, já que o contrato não foi
assinado.
Os documentos obtidos
pelo Estado mostram que a sociedade entre a Petrobras e PDVSA para construção
da refinaria nunca foi assinada. Existe hoje apenas um "contrato de
associação", um documento provisório, que apenas prevê, no caso de
formalização futura da sociedade, sanções pelo "calote" venezuelano.
Desde 2005, quando
esse termo de compromisso foi assinado pelos dois governos, até o ano passado,
a Petrobras tentou receber o dinheiro devido pela PDVSA - sem sucesso. Em
outubro do ano passado, quando o investimento na refinaria já chegava aos U$ 18
bilhões, a estatal brasileira desistiu.
Os venezuelanos não
negam a dívida. No item 7 do "contrato de associação" a PDVSA admite
sua condição de devedora. Antes desse documento, ao tratar do fechamento da
operação, uma das condições era o depósito, pelas duas empresas, dos recursos
equivalentes à sua participação acionária em uma conta no Banco do Brasil - o
que a o governo da Venezuela nunca fez.
Em outro documento
obtido pelo Estado, a Petrobras afirma que estariam previstas penalidades para
o "descumprimento de dispositivos contratuais". Como nos outros
casos, essa previsão não levou a nada, porque as penalidades só seriam válidas
quando a estatal venezuelana se tornasse sócia da Abreu e Lima - e isso não
ocorreu.
Chávez e Lula
A ideia de construir a
refinaria partiu de Hugo Chávez, em 2005. A Venezuela precisava de
infraestrutura para refinar seu petróleo e distribuí-lo na América do Sul, mas
não tinha recursos para bancar tudo sozinha. Lula decidiu bancar a ideia. Mas
Caracas nunca apresentou nem os recursos nem as garantias para obter um
empréstimo e quitar a dívida com a Petrobras.
Em dezembro de 2011,
em sua primeira visita oficial a Caracas, a presidente Dilma Rousseff tratou o
assunto diretamente com Chávez, que prometeu, mais uma vez, uma solução. Nessa
visita, o presidente da PDVSA, Rafael Ramírez, chegou a anunciar que
"havia cumprido seus compromissos" com a empresa e entregue uma
"mala de dinheiro em espécie" e negociado uma linha de crédito do
Banco de Desenvolvimento da China. Esses recursos nunca se materializaram.
O projeto inicial, que
era de US$ 2,5 bilhões, já chegava, em outubro do ano passado, aos US$ 18
bilhões, quando a Petrobras apresentou ao seu Conselho de Administração a
proposta de assumir integralmente a refinaria. A estimativa é que o custo total
fique em torno de US$ 20 bilhões.
Para justificar os
novos valores, a empresa cita ajustes cambiais e de contratos, gastos com
adequação ambiental e o fato de ter ampliado a capacidade de produção de 200 mil
para 230 mil barris por dia. Os novos itens e a ampliação da produção
explicariam o custo oito vezes maior que o inicial. Procurada pelo jornal O Estado de S. Paulo, para falar sobre o
"calote" da Venezuela, a Petrobras informou que nada comentará. As informações
são do jornal O Estado de S. Paulo.
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