A liberdade econômica nas
mãos do Congresso
A Câmara dos
Deputados concluiu o trabalho com a reforma da Previdência, mas a pauta
reformista continuará dominando a casa por muito tempo. E, antes da reforma
tributária, os deputados têm uma missão mais urgente: aprovar a MP da Liberdade
Econômica, que corre risco de caducar, no fim deste mês de agosto. O relatório
do deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) já foi aprovado na comissão mista de
deputados e senadores, e agora precisa passar pelos plenários das duas casas.
A livre iniciativa está
consagrada na Constituição Federal como fundamento da República Federativa do
Brasil (artigo 1.º, IV) e da ordem econômica nacional (artigo 170), mas a
realidade é muito diferente. A intervenção estatal existe em graus altíssimos,
impondo burocracias e exigências desnecessárias que sufocam o empreendedor
brasileiro. Esta carga tem origem ideológica, baseada em convicções
estatizantes que fazem do poder público o grande protagonista da atividade
econômica, mas também se alimenta do antigo preconceito contra o empreendedor,
o “patrão” que sempre age com a pior das intenções, e por isso necessita de um
cabresto legal para que não prejudique funcionários, fornecedores e clientes.
A MP da Liberdade
Econômica inverte completamente essa lógica. Assim como a reforma trabalhista de
2017, ela parte do respeito “à boa-fé do particular até prova em contrário”,
como diz o artigo 25 da MP. É extremamente louvável que este mesmo artigo
consagre o princípio da subsidiariedade, em seu inciso III, respeitando a livre
iniciativa e deixando ao Estado a tarefa de combater e coibir os abusos,
rejeitando o afã hiper-regulatório. É assim, por exemplo, que a MP pretende
derrubar uma série de exigências atuais para negócios considerados de baixo
risco, mas que hoje necessitam de inúmeras autorizações de diversos órgãos para
que possam funcionar.
É exagero afirmar que a
legislação trabalhista
é tema alheio ao da liberdade econômica
O coração da MP está
justamente na Declaração de Direitos de Liberdade Econômica e nos artigos sobre
os limites do Estado na atividade regulatória, que enumeram uma série de atos
que passarão a ser considerados abusivos. Nas negociações para conseguir
aprovar a MP, o governo corretamente não abre mão desses trechos e de alguns
outros, que incluem, por exemplo, a simplificação do processo de abertura e
fechamento de empresas.
Segundo o secretário de
Desburocratização e Gestão do Ministério da Economia, Paulo Uebel, várias
outras partes da MP podem ser discutidas e retiradas do texto final. Algumas
delas podem não ser tão essenciais quanto a Declaração de Direitos de Liberdade
Econômica, mas o governo até gostaria de vê-las preservadas; é o caso de
algumas mudanças em regras trabalhistas propostas não pelo Planalto, mas pelo
relator. Elas causaram polêmica e foram acusadas de serem “jabutis” que
promoveriam uma “minirreforma trabalhista” dentro da MP.
No entanto, é exagero
afirmar que a legislação trabalhista é tema alheio ao da liberdade econômica –
muito pelo contrário, pois a atividade econômica é diretamente afetada pelas
leis que regem as relações entre empregadores e empregados. Não à toa os
rankings de liberdade econômica sempre incluem uma avaliação das leis
trabalhistas: uma regulamentação excessiva engessa o empreendedorismo e
dificulta a geração de empregos. Não é nosso objetivo neste espaço
debruçarmo-nos sobre os dispositivos acrescentados ao relatório, e é possível
que alguns itens específicos mereçam uma discussão mais aprofundada; mesmo
assim, alegar que uma lei sobre liberdade econômica não pode tratar de relações
de trabalho é ignorar sua importância na construção dessa liberdade.
"Já outros itens são
completamente desnecessários, e o texto atual da MP parece estar repleto deles.
Na comissão mista, a versão original assinada por Jair Bolsonaro recebeu 301
propostas de emenda, das quais 126 foram aceitas integralmente ou parcialmente
por Goergen. Uma das alterações vindas do Congresso, por exemplo, chega ao
extremo de dispor sobre receitas de corridas de cavalos. O governo está
disposto a deixar de fora este e vários outros trechos controversos ou sem
conexão com o tema da MP, preferindo uma versão depurada que efetivamente se
concentre em garantir ao brasileiro a liberdade para fazer negócios.
O Brasil precisa da
aprovação da MP da Liberdade Econômica. Melhor que seja em uma versão
“concentrada”, livre dos excessos que desviam a atenção do tema principal; mas,
se a versão “inchada” chegar ao plenário, rejeitá-la toda por causa dos
“jabutis” seria jogar fora o bebê com a água do banho, desperdiçando uma
oportunidade ímpar de “tirar o Estado do cangote daqueles que produzem”, como
afirmou Bolsonaro na véspera da assinatura da MP. É preciso fazer do Brasil um
país verdadeiramente amigável ao empreendedor.
Gazeta do Povo - 09.08.2019
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