A batalha das privatizações vai começar
A expectativa superou a
realidade nesta quarta-feira, quando o governo divulgou os nomes das estatais
que pretende privatizar. As informações ao longo do dia incluíam na relação 17
empresas, incluindo as gigantes Telebrás, Correios e Eletrobrás, mas esta
última não figurava na lista de 11 estatais divulgada pela Casa Civil antes de
uma entrevista coletiva realizada no fim da tarde. Mesmo assim, o saldo é
positivo e o governo de Jair Bolsonaro demonstra a intenção de mexer em algumas
das “vacas sagradas” do estatismo brasileiro, contrariando até mesmo os desejos
de ministros como Marcos Pontes, da Ciência e Tecnologia – que desejava manter
tanto os Correios quanto a Ceitec, fabricante de semicondutores.
A ausência mais sentida,
evidentemente, foi a da Eletrobrás. No entanto, já existe um projeto de lei
tramitando no Congresso Nacional desde o governo Michel Temer, prevendo a
privatização da empresa. Além disso, o ministro Paulo Guedes foi bem enfático
na manhã de quarta-feira, quando falou sobre a venda de ações da empresa para
que a União deixasse de ser o acionista majoritário. Para completar, o
presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também endossou a ideia, deixando
em aberto apenas a estratégia para realizar a venda – o Congresso pode seguir
com o projeto de lei original, ou receber um texto novo, elaborado pelo governo
Bolsonaro.
O protagonismo na
atividade econômica é do setor privado e, depois de décadas de estatismo, o
país tem um governo que enxerga isso com clareza
Um mero passar de olhos
pela lista divulgada pelo governo, mesmo mais enxuta que aquela sobre a qual se
especulou ao longo da quarta-feira, mostra a necessidade urgente de várias das
privatizações anunciadas. Não há razão para o governo ter fábricas de
semicondutores, ainda mais quando a Ceitec nem é capaz de gerar receita para
cobrir seus custos, sendo totalmente dependente de repasses da União. É o mesmo
caso, aliás, da Trensurb e da CBTU, operadoras de metrô subterrâneo ou de superfície
em seis capitais brasileiras. A lógica consagrada na Constituição, em seu
artigo 173, é a de que o Estado só explora diretamente a atividade econômica
quando está em jogo a segurança nacional ou quando há “relevante interesse
coletivo”, um conceito impreciso que foi esticado até o seu limite para
justificar a existência de 130 empresas controladas pela União, sem falar de
tantas outras que pertencem a estados e municípios.
Com a ausência da
Eletrobras, os Correios se tornam a “joia da coroa” da lista divulgada na
quarta-feira. Por mais que Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes já viessem
tratando do tema, faltava a confirmação oficial. Assim como a Petrobras, os
Correios já foram um orgulho nacional dilapidado pelo lulopetismo – é preciso
lembrar que foi a CPI dos Correios que deu origem ao escândalo do mensalão. A
corrupção e a má gestão destruíram especialmente o fundo de pensão dos
funcionários da estatal, o Postalis, a ponto de ele ter sido alvo de
intervenção federal em 2017. Os sucessivos rombos no fundo exigiram
contribuições adicionais dos participantes, chamados a pagar o prejuízo.
O desafio das
privatizações (editorial de 21 de julho de 2019)
Mas, como o próprio
presidente Bolsonaro já admitiu, a divulgação da lista é apenas passo inicial,
indicando que houve aprovação do conselho do Programa de Parcerias de
Investimentos (PPI). A batalha propriamente dita se dará no Congresso, que
precisa dar seu aval a todas as privatizações, graças a uma decisão equivocada
do Supremo Tribunal Federal, que preferiu seguir uma regra inventada por
Ricardo Lewandowski a aplicar o artigo 173 da Constituição. O governo terá de
superar resistências de vários tipos de parlamentares: aqueles que, por ideologia
estatizante, são contrários às privatizações; aqueles cuja base eleitoral é
formada por servidores públicos, incluindo o das empresas que se quer
privatizar; e, por fim, aqueles que se acostumaram a fazer indicações políticas
para diretorias e gerências em troca da oferta de apoio político, e por isso
veem as estatais como propriedade particular ou partidária.
Para um governo atolado em
déficits primários, privatizações são uma necessidade dupla: a empresa, nas
mãos da iniciativa privada, ganha capacidade de investimento, e o governo
levanta mais recursos para tapar os buracos. Mas, ainda que estivéssemos com as
contas em ordem, fazendo superávits seguidos, o enxugamento do Estado
continuaria sendo um imperativo, guiado pelo princípio da subsidiariedade. O
protagonismo na atividade econômica é do setor privado e, depois de décadas de
estatismo, o país tem um governo que enxerga isso com clareza.
Gazeta do Povo
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