sábado, 29 de junho de 2019






Por que o acordo Mercosul-UE 
demorou tanto a sair?


Desde o século passado, Mercosul e União Europeia negociam um acordo de livre comércio, na maior parte do tempo com mais retrocessos do que avanços. Durante mais de 20 anos, países integrantes de ambos os blocos atravessaram um amplo espectro político, mas as conversas esbarravam no mesmo impasse: a resistência protecionista de agricultores europeus, receosos da concorrência dos produtos sul-americanos.

Da assinatura de um termo de cooperação comercial, em 1992, até o acordo firmado nesta sexta-feira (28), o ceticismo preencheu extensas reuniões e baixou expectativas nos dois blocos, com 32 países que abrangem 780 milhões de pessoas e 25% do PIB mundial.

De início, havia mais disposição do lado sul-americano para levar adiante a integração com a UE. Subsidiados pela Política Agrícola Comum (PAC), produtores europeus, respaldados sobretudo pela França, apresentaram entraves a qualquer acordo.

Num discurso no Parlamento francês, em 2001, o então presidente brasileiro Fernando Henrique Cardoso, um dos entusiastas do acordo, expressou, porém, preocupação de que as aspirações protecionistas superassem o espírito do livre comércio.

A virada no campo ideológico de governos da América do Sul deixou em banho maria a viabilização do tratado. O Brasil de Lula e a Argentina dos Kirchner não priorizaram negociações, que foram estancadas entre 2004 e 2010. Enquanto isso, o Mercosul voltava-se para si próprio e expandia tentáculos pelo continente. A UE enfrentava crise, austeridade e desemprego.

Tentativas de alavancar o diálogo foram feitas em 2010 e 2016, mas não se concretizaram, apesar da mudança de tom. A retórica agora apontava para o compromisso, com restrições da UE à carne bovina e ao etanol.

Dois anos depois, no apagar das luzes do governo Temer, o então chanceler Aloysio Nunes anunciava que 12 dos 15 capítulos do acordo tinham sido concluídos. “Em termos quantitativos, podemos dizer, sem medo de errar: o principal já foi feito”, assegurou.


Do lado argentino, o governo Macri limou resistências alimentadas pelos antecessores de que o acordo dificultaria a sobrevivência de empresas nacionais. Para o atual presidente, assinatura do acordo neste momento ainda traz outra vantagem: dá fôlego à sua campanha pela reeleição.

Sandra Cohen
Especializada em temas internacionais, foi repórter, correspondente e editora de Mundo em 'O Globo'

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