Eliane Cantanhêde
Os atos seguintes à restrição de foro
privilegiado de deputados e senadores confirmam que a questão
já está madura nas instituições e na sociedade brasileira. Seja retaliação ou
não, há mobilização para limitar o foro também para os outros Poderes, o
Executivo e o próprio Judiciário. Resta ver se vai andar mesmo.
O próximo presidente do Supremo, Dias Toffoli, não perdeu tempo. No mesmo dia da
decisão sobre os parlamentares, um funcionário já entregava no seu gabinete uma
caixa de um palmo e meio de altura com os processos contra quem tem mandato. No
dia seguinte, ele já enviava nove deles para outras instâncias.
Nesta semana, Toffoli deu um passo ainda mais largo, ao
levar para a presidente Cármen Lúcia duas propostas de súmulas vinculantes, ou seja, para submeter
todas as instâncias abaixo à decisão do Supremo. Mas com uma interpretação,
digamos, ampliada.
A primeira proposta é para a regra que passa a valer para
deputados e senadores ser estendida a todos os que têm foro privilegiado no
Legislativo, Executivo, Judiciário e Ministério Público. A segunda proposta é
para tornar inconstitucionais todas as previsões de foro privilegiado nas
constituições estaduais e na Lei Orgânica do Distrito Federal. A intenção é
limitar o foro de 55 mil agentes públicos nas esfera federal, estadual e
municipal.
No mesmo embalo, o ministro Luís Felipe Salomão, do
Superior Tribunal de Justiça (STJ), empurrou para a primeira instância em João
Pessoa um processo contra o governador Ricardo Coutinho (PSB) por crime que
teria sido cometido antes do atual mandato. O ministro usou a decisão do STF, mas
a verdade é que essa decisão não gerava vinculação automática.
Logo, ele quis foi jogar luzes para a questão, que agora
vai parar na Corte Especial do STJ, que é, ou era, foro privilegiado para
governadores, desembargadores e conselheiros dos tribunais de contas dos
Estados.
Se o Judiciário pisou no acelerador, o Legislativo não
ficou atrás e a Câmara instalou a Comissão Especial para analisar a restrição
de foro para todo mundo, inclusive ministros de Estado e ministros de tribunais
superiores. Pelo projeto em discussão, só manteriam, ou manterão, a
prerrogativa os presidentes da República, do STF, da Câmara e do Senado.
É claro que os parlamentares vão jurar que isso não tem
nada a ver com retaliação, mas a data da criação da comissão – na semana
seguinte à restrição de foro só para deputados e senadores – indica exatamente
o contrário. Soa assim: “Se vale para nós, por que não vale para os outros?”
Tudo parece muito rápido, mas calma lá! Estamos falando
de Brasil, de Justiça e de Congresso Nacional. No Supremo, há ainda um longo
caminho para as duas propostas de súmulas vinculantes de Toffoli, que ainda
irão à análise da Procuradoria-Geral da República e dependem depois de Cármen
Lúcia pôr ou não em pauta. Quanto tempo isso pode demorar? Vá se saber...
E, no Congresso, há um obstáculo de ordem prática,
objetiva: enquanto durar a intervenção federal na segurança pública do Rio,
nenhuma emenda constitucional pode ser votada. E há outros mais prosaicos: com
Copa do Mundo, convenções partidárias e campanha eleitoral, quando haverá
quórum para uma votação assim? Possivelmente, só no ano que vem. Se houver...
Então, há muita correria, mas não esperem que seja para
chegar logo a algum lugar. Por enquanto, é só guerra de nervos, para não falar
em confronto entre Poderes.
Lula
Por que, em rara unanimidade, o plenário virtual da
Segunda Turma negou o agravo para anular a prisão de Lula? Porque os votos
foram estritamente técnicos.
Publicado no portal do jornal Estado de São Paulo em
11/05/2018
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