A desculpa do
‘antipetismo’*
É muito conveniente, para os petistas, atribuir suas
previsíveis dificuldades eleitorais neste ano, especialmente em São Paulo, ao
tal “ódio ao PT” que eles tanto vivem a denunciar. O melancólico, mas merecido,
quarto lugar do prefeito Fernando Haddad na pesquisa do Datafolha de intenção
de voto à Prefeitura parece dar razão aos estrategistas de sua campanha que
querem descolar o alcaide da desastrosa imagem de seu partido – estigma que,
segundo esse raciocínio, excita na classe média paulistana seu atávico antipetismo.
No entanto, essa é, como de hábito, uma desculpa esfarrapada: a hostilidade ao
PT realmente cresceu nos últimos anos e acentuou-se mais recentemente, mas não
em razão de preconceito contra o partido, e sim por ter ficado clara a brutal
incompetência administrativa dos petistas, não apenas no Município de São
Paulo, mas na gestão federal.
É por esse motivo que está cada vez mais difícil
encontrar eleitores que se dizem petistas ou que tenham alguma boa vontade com
o partido. As últimas eleições mostraram que o grosso do voto na sigla
construída por Lula da Silva começa a se concentrar onde a pobreza e o atraso
limitam o senso crítico dos eleitores. Especialmente nas regiões
metropolitanas, antigo reduto do Partido dos Trabalhadores, o definhamento da legenda
se acelerou – a pesquisa do Datafolha mostra que a simpatia pelo PT em São
Paulo, por exemplo, caiu de cerca de 25% há quatro anos para 11% agora. O PT
ainda é o partido que tem mais eleitores cativos na capital paulista, mas nem
de longe apresenta o vigor dos tempos, nem tão distantes, em que o lulopetismo
se arrogava o privilégio de ditar os termos da história.
Quando questionados sobre o fenômeno, os petistas têm uma
explicação na ponta da língua: trata-se do resultado de uma gigantesca
orquestração promovida para difamar o PT. E tudo, é claro, para impedir que o
chefão Lula vença as eleições presidenciais de 2018. Como escreveu o presidente
do PT, Rui Falcão, em texto publicado pelo partido no dia 18, a “insidiosa
campanha da mídia monopolizada” e a “perseguição implacável de autoridades
parciais” visam a “infligir uma derrota acachapante ao PT nas eleições
municipais” e a frustrar a eventual candidatura de Lula, “liderança
inquestionável” nas pesquisas.
Entre os conselheiros de Haddad, o discurso é o mesmo. Já
há quem diga, aqui e ali, que o prefeito, se quiser se reeleger, terá de
encontrar meios de lidar com a carga da impopularidade da presidente afastada
Dilma Rousseff e do PT, sem falar na do próprio Lula, que em São Paulo enfrenta
grande rejeição. Isso seria, na opinião desses assessores, o maior obstáculo de
Haddad.
Assim, com a desfaçatez habitual, os petistas vão
construindo a fantasia segundo a qual o problema eleitoral do PT está no
eleitor – instigado pela “mídia monopolista” e pela “elite golpista” a odiar os
petistas – e não no próprio partido, cujos delírios de uma revolução social
financiada pelo Estado resultaram na maior crise econômica da história recente,
sem falar na desmoralização da política pela via da institucionalização da
corrupção.
Seria realmente espantoso se a esta altura, com a
exposição escancarada da incompetência dos companheiros Haddad e Dilma, os
eleitores não manifestassem repúdio ao modo petista de governar. É provável que
entre os que reprovam o prefeito e a presidente ora afastada haja mesmo muitos
antipetistas convictos, desses que escolhem o candidato pelo potencial para
derrotar o PT. Mas é evidente que, diante do descalabro dos governos de Dilma e
de Haddad, com desemprego, recessão, contas no vermelho, ruas esburacadas,
ciclovias improvisadas, saúde em pandarecos, educação vergonhosa e muitas, mas
muitas promessas grandiosas não cumpridas, a decisão de desalojar o PT do poder
o quanto antes seja a mais racional a ser tomada na hora de votar.
A própria Dilma reconheceu isso, ainda que por obra de
evidente ato falho. Em evento em uma universidade do ABC, depois de ter sido
criticada por um dos presentes, a petista, sem querer, explicou por que foi
afastada da Presidência: “Uma das constatações que temos que fazer é que algo
não deu certo, tanto é que eles estão lá, e nós, aqui”. Bingo.
*Publicado no estadão.com em 21/07/2016
Nenhum comentário:
Postar um comentário