Basta de toma lá dá cá*
O Estado noticiou que o “Congresso só
apoia pacote de Temer com alterações”, dando conta, com base em declarações de
líderes dos sete maiores partidos representados no Parlamento, de que senadores
e deputados não querem se comprometer prévia e incondicionalmente com a pauta
econômica do presidente em exercício Michel Temer, especialmente com as duas
medidas consideradas prioritárias: o teto dos gastos públicos e a reforma da
Previdência. Por óbvio, não chega a ser notícia o fato de que parlamentares
estejam dispostos a, antes de votar, examinar e discutir projetos apresentados
pelo governo. É para isso também que senadores e deputados são eleitos.
Não foi, portanto, a obviedade da declaração que chamou a
atenção dos repórteres que levantaram o assunto. O que não escapou aos
jornalistas habituados ao trato de questões políticas complexas e
controvertidas foi a intenção sutilmente implícita naquilo que disseram as
lideranças partidárias: os parlamentares não pretendem entregar de bandeja ao
Planalto os votos nos quais muitos já estão colocando preço, até mesmo antes de
conhecer precisamente o conteúdo de projetos que ainda nem lhes foram
apresentados. Nenhuma novidade. É assim, infelizmente, que funciona esse
Parlamento em que as preocupações dos representantes eleitos pelos cidadãos
raramente vão além do controle que pretendem manter sobre seus redutos
eleitorais e seu patrimônio material.
Mais do que ninguém, senadores e deputados deveriam saber
que o Brasil vive um momento extremamente delicado, de uma crise econômica e
social grave – para não falar na crise política e moral – que exige de todos,
principalmente dos governantes e representantes do povo, competência,
determinação e desprendimento. É hora de colocar de lado interesses pessoais e
de grupos para concentrar-se no objetivo, que deveria ser comum, de criar
condições objetivas para o saneamento das contas públicas e a aprovação de
medidas estruturantes que propiciem a retomada do crescimento, condição
indispensável para a garantia e ampliação dos direitos dos cidadãos e das
conquistas sociais. Não é hora, portanto, de espertezas para garantir vantagens
em nefasto toma lá dá cá.
A atitude que se espera de lideranças políticas
responsáveis, no momento em que os parlamentares vão votar medidas, muitas
delas impopulares, urgentes e indispensáveis para a correção dos erros
praticados pelo tsunami populista do lulopetismo, é de inequívoca disposição de
fornecer ao governo os instrumentos de que ele acredita necessitar para
enfrentar o desafio que tem pela frente. Não significa, é claro, que os
parlamentares devam entregar a Michel Temer um cheque em branco. Ninguém
imagina que as medidas que o governo vai propor não possam ser eventualmente
corrigidas e aperfeiçoadas pelo bom debate, que tenha como objetivo o bem comum
e não interesses mesquinhos.
Melhor serviço teriam prestado ao Brasil os líderes
partidários ouvidos pelo Estado – todos de legendas aliadas ao
Planalto – se, sem renunciar às prerrogativas inerentes ao mandato parlamentar,
tivessem dado ênfase à intenção de ajudar o governo a fazer o que for
necessário para enfrentar a crise, assumindo patrioticamente a
corresponsabilidade pelo programa de austeridade. Isso seria política sadia.
A responsabilidade de assumir essa postura construtiva de
que o futuro do País depende deveria ser liderada pelo PMDB que, afinal, é o
partido do presidente em exercício. Se assumiram o poder e pretendem mantê-lo
pelos menos até 2018, Michel Temer e seus companheiros devem se compenetrar de
que as mudanças pelas quais o País anseia passam necessariamente pela
moralização das práticas políticas. Acordos e alianças fazem parte do jogo
democrático. No momento, são indispensáveis para garantir apoio parlamentar às
mudanças importantes e polêmicas que o governo precisa implementar porque a
Nação exige mudanças. Mas existe uma enorme diferença entre formar maioria na
defesa de interesses nacionais e vender voto, no varejo ou no atacado, pagos em
pixulecos. Os tempos mudaram e com eles devem mudar os costumes. Basta de toma
lá dá cá.
*Publicado no Estadão.com em 1º/06/2016
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