Em ebulição*
Eliane Cantanhêde
O parecer do relator Jovair Arantes
(PTB), favorável ao impeachment de Dilma Rousseff, pode ser chamado de qualquer
coisa pelo governo, mas foi perspicaz. Considerou as questões jurídicas e as
pedaladas fiscais, descartou uma das imputações e citou o ambiente de recessão e
de desemprego em que a questão – essencialmente política – se desenvolve.
Arantes também delegou o julgamento
final ao Senado, deixando uma brecha para que novas denúncias, dessas que
pipocam a toda hora, como a da delação da empreiteira Andrade Gutierrez, possam
ser acrescentadas mais adiante à argumentação pró-afastamento de Dilma. O
governo não tem dúvidas: vai perder na Comissão do Impeachment e precisa
“trabalhar” o plenário da Câmara.
Sendo assim, o parecer virou senha
para pressionar os partidos, atrair apoios e convencer os que são, ou se dizem,
indecisos. O presidente do PP, Ciro Nogueira, anuncia que o partido é contra o
impeachment, mas o racha interno não deixa nada a dever ao do PMDB e pode ser
bem ilustrado por Paulo Maluf. Antes contra, agora ele se diz a favor do
afastamento de Dilma, indignado com a imoralidade da compra de votos pelo
governo. A gente bem poderia dormir sem essa...
O pequeno PV, que abriga o deputado
Sarney Filho, caçula do ex-presidente José Sarney, um dos próceres do PMDB, vai
votar contra Dilma. A forte e suprapartidária bancada evangélica também. No
PMDB, o senador Romero Jucá assume a presidência pronto para os embates com o
governo e com a ala governista. Ele tem dois trunfos: a tribuna do Senado a
qualquer momento e o fato de ter votado contra Dilma e a favor do tucano Aécio
Neves em 2014. De incoerência, não pode ser acusado.
“O processo (de impeachment)
está em aberto, não há vencedor ainda. É um processo em ebulição nos partidos,
na sociedade e nos poderes da República”, disse ele ontem, depois de enviar
para o Conselho de Ética do PMDB os pedidos regionais de expulsão dos que
insistem em se manter ministros. Pensa, ainda, em fechar questão a favor do
impeachment. Ou seja: os pemedebistas que votarem contra estarão sujeitos a
sanções.
Fora do Congresso, mas nem tanto, a
Confederação Nacional da Agricultura e a Sociedade Rural Brasileira divulgaram
notas apoiando o afastamento da presidente. Não fosse por outra coisa, porque
não digeriram os palanques de Dilma no Planalto, aquiescendo quando militantes
rurais ameaçaram invadir fazendas caso ela caia. Detalhe: a presidente
licenciada da CNA é Kátia Abreu, ministra da Agricultura e amiga de
Dilma.
Esse movimento do setor ruralista vai
ao encontro do que a consultoria Macroplan apurou, de 28 a 31 de março, com 60
empresários, executivos, gestores públicos, economistas, cientistas políticos e
jornalistas: para 69%, Dilma sofrerá impeachment ainda neste ano. Além disso,
14% acreditam em cassação pelo TSE, 14% que Lula possa repactuar o governo, 7%
que Dilma ficará e a economia continuará a afundar. Do total, 4% ainda creem na
renúncia.
Em Brasília, ninguém sabe com certeza
o que vai acontecer, mas todo mundo sabe que alguma coisa tem de acontecer.
Impeachment ou não, cassação da chapa Dilma-Temer no TSE, antecipação das
eleições... Quem tem tanta alternativa é porque, talvez, não tenha nenhuma. Ou
só tenha, de fato, uma: o impeachment.
Os defensores dessa tese acreditam
que a economia, a Lava Jato e as delações sobre as campanhas de Dilma têm um
efeito direto no eleitor. Logo, no voto do parlamentar sobre o impeachment.
Como diz Jucá, refletindo um temor generalizado: “Sem impeachment, o dia
seguinte não será de vitória do governo e de Dilma, mas um estouro do mercado,
com o agravamento de uma situação na economia que já é dramática e se agrava
com grande velocidade”. Quem haverá de discordar?
Publicado no Estadão.com em
08/04/2016
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