Um pouco do mesmo. Apenas bem
diferente! (4)
Vergonha alheia
Cesar Cabral*
Delírios a parte, fico com minha
vergonha alheia já que não posso me desfazer dela. Existem diversas maneiras de
sentir vergonha essa sensação esquisita que quando a gente sente não sabe onde
se enfiar. Exceto é claro aqueles que não têm vergonha nenhuma; nem meio pingo
de vergonha. Quem sente vergonha sente-se arrasado, infeliz e desorientado com
esse sentimento que pode roer-lhe as
entranhas. Há diversos tipos de
vergonha, e uma delas é a vergonha alheia, tão comum hoje em dia que o efeito é
passageiro, na maioria. Todo mundo comenta na hora e depois ela vai passando
até que o infeliz sinta a próxima.
Essa vergonha, a alheia, como diz o
nome, vem de fora da pessoa envergonhada; foi cometida por outro que não o
envergonhado. Geralmente as causas são profundas e vem de longo tempo; mas a
gente só sente quando ela estoura de vez.
Pega de surpresa e, por isso, pode
causar maior impacto como o comportamento de algumas pessoas que me faz pegar
nojo. De outras, pego admiração. Peguei nojo, e faz tempo, de gente espaçosa;
aquelas que ocupam as três dimensões simultaneamente, (que palavrão!) que
roubam o oxigênio num raio de mil quilômetros.
Os exemplos são tantos que perdi a
conta e as anotações embora muitos deles não me saem da lembrança. Certa vez
numa loja de artesanato numa cidade do nordeste dois turistas gaúchos compravam
as pampas e gritavam como quem toca as vacas no campo num petiço sogueiro. Um
deles percebeu que eu estava olhando com olhar de nojo e aí sem imaginar que eu
era seu conterrâneo, sem dúvida, soltou num berro: “vou levar mais um destes
pros tchês lá de baixo”! Ninguém entendeu nada; nem os gaúchos. Mas o que era
mais um destes pros “tchês lá debaixo?” Era rapadura, que se
comprava em Santo Antônio da Patrulha a caminho da praia, além de sonho e
cachaça azulzinha (não sei se ainda é assim). Mais conhecida no nordeste, a
rapadura também é conhecida, produzida e consumida na maior parte da América
Latina – da Venezuela ao México.Menos no Uruguai e evidentemente que também não
em Piriápolis.
Outro nojento de um grupo na praia -
aqui ninguém tem que levar as traquitanas pra beira do mar. Tem barracas com
tudo. Alias barraca é um nome que ficou pelo hábito, pois algumas são tão,
digamos, sofisticadas, que tem piscina – grande, de nadar e mergulhar –
garçons, bar, restaurante... Pois um nojento espaçoso e sua turma bebiam
cerveja – outro detalhe: são sempre muito geladas – quando um
deles levantou-se arregaçou a
bombacha até os joelhos e vestido com uma camiseta onde se lia “Sou do Sul”,
passou a mão na cuia de mate já cevado, meteu uma garrafa termica no sovaco e
foi “chimarrear” na beira do mar. E quando a onda chegava mais alta, dava uns
pulinhos! Sei lá pra quê. Mas, pensei, será o efeito da água morna do chimarrão
com a cerveja gelada no estomago do nojento?
Dei uma gargalhada. O garçom que
passava por perto me olhou e eu perguntei: o que é aquilo? “São os gaúchos”,
ele respondeu perguntando. “O senhor é paulista, nénão?” - “Não, respondi, sou
do Acre”! Juro pela santa mãe de Sepé Tiaraju!
Num intervalo das minhas
escrevinhanças liguei a TV pra saber se o diretor da Petrobras ia ou não ia
abrir a boca. Abriu pra dizer que não ia abrir a boca.
Babaquice minha! Até as paredes
sabiam. Mas, foi no exato momento em que o deputado Onix estava falando,
chamando o cara de bandido, agarrado numa cuia de chimarrão e segurando uma
garrafa térmica. Isso às 3 horas da tarde numa CPMI do Congresso Nacional.
Não estou negando “minhas raízes”,
se é que isso existe; mas sou porto alegrense, onde esse estereótipo de gaúcho
(não no sentido de preconceito, mas sim de modelo ou conceito estabelecido como
padrão) só se vê na “Semana Farroupilha”. É que
não suporto mais gente espaçosa; e
aqui onde moro também tem muitas delas. E como tem!
*Jornalista e escritor
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