Assombração
Eliane
Cantanhêde*
Lula já se reuniu com jovens líderes ligados ao PT e desenhou uma
assombração: é a "direita" que está borrando a imagem do Brasil no
exterior e esborrachando a de Dilma internamente.
Não que Lula não enxergue e não critique os erros na economia, a
inabilidade política da pupila e a competência do governo, mas ele precisa
construir um culpado, já que ela não pode ser a culpada. Comprometeria a
eternização no poder.
Ok. Os críticos são sempre "adversários", adversários são
"da elite" e a elite que incomoda é "de direita". A isso a
gente já está acostumado. Mas o que é, quem é e que cara tem essa tal nova
"direita"?
Democracias comportam tendências de esquerda, centro e direita. Os
conservadores estão ganhando ousadia, até impondo uma pauta-retrocesso no
Congresso, da "cura gay" ao "Estatuto do Nascituro" e ao
cheiro de CPI do aborto no ar. Nada disso, porém, está dando certo,
especialmente depois dos protestos de rua. Aliás, a marcha dos evangélicos
encolheu 40% em relação a 2012.
E os partidos aliados reclamam de barriga cheia, as empreiteiras estão
felizes da vida com Copa e Olimpíada (e jogando um bolão com Lula), os bancos
sentiram a marretada nos juros, mas vêm de anos de lucros recordes e esfregam
as mãos com o recrudescimento da Selic. Mais: se há alguém feliz com Dilma, é a
cúpula do agronegócio.
Que outra "direita" teria organização e discurso capazes de
pôr um milhão e meio de pessoas nas ruas contra tudo e contra todos?
Só restaria a Lula carimbar de "direita" a garotada, a classe
média, os idosos e os internautas que exigem transporte, educação, saúde,
segurança e, sobretudo, respeito. Uma péssima ideia dele, logo quando a cúpula
do PT planeja fazer o inverso: infiltrar seus militantes nos movimentos
independentes.
A assombração, portanto, não mete medo em ninguém.
A assombração, portanto, não mete medo em ninguém.
*Jornalista e colunista da Folha de São Paulo
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