Sai a reforma, ficam as contas
Congelada a reforma da Previdência, a vida prossegue, o
governo tem de cuidar das contas deste ano e ainda precisa montar o Orçamento
de 2019, tarefa especialmente difícil e delicada. Sem a mudança no sistema
previdenciário, será preciso planejar um corte de R$ 14 bilhões nas despesas do
próximo ano, disse ao Estadão/Broadcast o ministro do Planejamento,
Dyogo Oliveira. Para isso será necessária uma revisão mais detalhada e mais
severa de cada grupo de gastos. O procedimento seguinte poderá envolver, além
da tesourada no dispêndio, uma unificação de programas. Na melhor hipótese, o
novo presidente, eleito no fim de 2018, concluirá seu primeiro ano sem violar a
meta fiscal ou a regra de ouro, isto é, a proibição de endividar o Tesouro para
cobrir parte do custeio. Mas terá de enfrentar os efeitos de uma dívida
crescente, a expansão veloz do gasto obrigatório e, de modo especial, o peso
cada vez maior das aposentadorias.
Com a redução dos juros básicos, permitida pelo amplo
recuo da inflação, a dívida pública tem crescido um pouco mais devagar. De toda
forma, o passivo financeiro do governo continua aumentando e a relação entre a
dívida e o Produto Interno Bruto (PIB) tende a elevar-se nos próximos anos.
Embora a inflação deva continuar na meta ou pouco abaixo desse ponto,
especialistas projetam para 2019 e 2020 juros mais altos que os atuais. Também isso
afetará a gestão financeira do próximo governo.
O quadro poderá ficar mais complicado com qualquer novo
rebaixamento do crédito brasileiro. Até agora, a má classificação do Brasil
pelas agências de avaliação de risco tem produzido pouco ou nenhum efeito nos
mercados. O fluxo de investimentos e financiamentos continua satisfatório. Mas
o cenário tenderá a mudar, se os juros externos subirem mais velozmente. Nesse
caso, a opinião das agências de classificação poderá ter mais peso nas decisões
de financiadores e investidores. Com o congelamento da reforma da Previdência,
representantes das classificadoras já falaram sobre o risco de novos cortes da
nota brasileira.
A curto prazo, a equipe econômica tem de enfrentar duas
tarefas complexas. Até junho deverá enviar ao Congresso o projeto da Lei de
Diretrizes Orçamentárias (LDO), com as linhas básicas da programação financeira
do próximo ano. Em seguida, deverá trabalhar na proposta do Orçamento, para
entregá-la até 31 de agosto. Um dos principais desafios será montar uma
blindagem contra a violação da regra de ouro. Se romper essa regra, o novo
presidente poderá ser acusado de crime de responsabilidade.
Para este ano os ministros da área econômica têm dado
como certos o cumprimento da regra de ouro e o da meta fiscal, assim como o
respeito ao teto de gastos. A meta fiscal determina o valor de R$ 159 bilhões
como limite para o déficit primário, isto é, para o saldo calculado sem a conta
de juros. Podem estar certos, mas o mero respeito a esses limites ainda será um
desempenho pouco satisfatório.
Afinal, a administração tem tarefas básicas e programas
para executar. Mesmo para executá-los modestamente, o governo precisará de
verbas previstas no Orçamento, mas ainda muito incertas. Parte do dinheiro
poderá vir da reoneração da folha de pagamentos, mas o relator do projeto,
deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), já anunciou a intenção de manter o benefício
para grande número de setores. Ou seja, anunciou que, mais uma vez, o interesse
particular, favorecido há anos por uma desoneração mal planejada, será
sobreposto ao interesse geral.
Para operar com menor aperto o governo depende também da
aprovação de outros projetos, como o da privatização da Eletrobrás. A proposta
de adiamento do reajuste do funcionalismo nem está em condições de ser votada,
porque seus efeitos estão suspensos pelo ministro Ricardo Lewandowski, do
Supremo Tribunal Federal. Enquanto o projeto permanece encalhado, o Tesouro vai
gastando. Nesse jogo, alguns ganham à custa de todos, principalmente dos mais
dependentes da execução das funções públicas. Como ocorre há muito tempo, tudo
se passa como se o equilíbrio do Tesouro fosse responsabilidade só do
Executivo.
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