O risco de uma crise contratada*
O advogado Cristiano Zanin Martins, que defende Lula em
processos da Operação Lava Jato, diz esperar “um julgamento isento” quando o
Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre, reunir-se no próximo
dia 24 para decidir sobre o caso do tríplex do ex-presidente na praia do
Guarujá.
A senadora Gleisi Hoffmann, presidente do PT, diz que “a
única solução possível” para o julgamento “do ponto de vista legal é a
absolvição”. Uma sentença condenatória simplesmente “não será uma sentença
justa”, segundo ela. E por tabela, não deveria ser respeitada por ninguém.
“Se eles fizerem uma coisa dessas, existe a possibilidade
de uma rebelião popular”, dispara o senador Lindberg Farias (PT-RJ). Afirma
Tarso Genro (PT-RS), ex-ministro da Justiça: “Lula tem a obrigação de
submeter-se à soberania popular e contestar as acusações que lhe são feitas”.
Ou seja: “um julgamento isento” e a única solução
possível “do ponto de vista legal” seriam aqueles que resultassem na absolvição
do ex-presidente. Do contrário, Lula terá a obrigação de disputar as próximas eleições
mesmo impedido pela Justiça. E o país correrá o risco de ser palco “de uma
rebelião popular”.
Estamos entendidos? Legal e justo para o PT é somente o
que o PT aceita como legal e justo – dane-se a Justiça, dane-se o que está
escrito nas leis, dane-se o bom senso, e dane-se o que no passado recente disse
ou praticou o próprio PT. Ou vai ou racha. Condene-se Lula para ver só uma
coisa! (Isso pode, Arnaldo?)
“É preciso derrotar o golpe em todas as suas
manifestações e a ofensiva reacionária de parte do Judiciário é uma delas”,
conclama nota oficial do PSOL divulgada no último sábado. Curioso! A ser um
golpe a possível condenação de Lula, o PT e o ex-presidente não deveriam ter
participado dele. Deveriam apenas tê-lo denunciado.
Mas participaram, sim, e continuarão participando até
ficarem roucos de tanto gritar que é um golpe, até se resignarem a concorrer às
eleições deste ano com outro nome na impossibilidade de Lula ser candidato.
Nessa hipótese, o nome seria o do ex-ministro e ex-governador da Bahia Jaques
Wagner.
Dilma reconheceu a legitimidade do processo de
impeachment ao se defender das acusações em todas as instâncias da Justiça, ao
comparecer ao Congresso para ser interrogada pelos senadores, e, por fim, ao se
beneficiar do ato criminoso do Senado – esse, sim, um golpe – que preservou
seus direitos políticos.
A Constituição manda que, uma vez cassada, a pessoa perca
o direito de se candidatar e de exercer cargos públicos por oito anos. Sabe
muito bem disso o ministro Ricardo Lewandowisk, que comandou a fase final do
processo de impeachment na condição de presidente do Supremo Tribunal Federal.
Ou sabia e esqueceu.
Lula repete o comportamento de Dilma – com uma diferença.
É mais agressivo do que ela na contestação ao devido processo legal. Não perde
uma única oportunidade de avacalhar a Justiça. E como é popular e Dilma nunca
foi, vale-se de sua força eleitoral para atrair parte do povo em sua defesa.
Foi uma parte minúscula do povo que atendeu ao convite e
que participou dos comícios de Lula promovidos ao arrepio da lei nos últimos
meses. Mas nada impede que essa parte possa crescer a depender da consistência,
ou da falta dela, do juízo a ser conhecido dentro de nove dias. Haverá dias
turbulentos pela frente. Ou meses.
Cabe a Justiça ser rápida para condenar ou absolver Lula.
Do contrário teremos uma crise inédita e contratada desde já: a de um
ex-presidente, líder nas pesquisas de intenção de voto, impedido de disputar
eleições às vésperas das próximas. Ou pior: em meio a uma campanha oficialmente
em curso. Seria o pior dos mundos.
*Publicado no Portal Veja em 15/01/2018
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