Me engana que eu gosto*
Luislinda Valois, Lula e Bolsonaro, exemplos
de mistificação para tirar vantagem
Eliane Cantanhêde
Políticos vivem de mistificações e muitos deles, ao mesmo
tempo em que se colocam como vítimas por serem negros, mulheres, (ex) pobres ou
de recantos longínquos do País, usam essas mesmas condições para se fazerem
populares e abocanharem privilégios. Ninguém desconhece que o Brasil tem ranços
racistas e machistas e que a principal origem de nossas piores mazelas está na
desigualdade social, mas usar essa triste realidade para detratar os
adversários, de um lado, e obter simpatias e boquinhas, do outro, é ilegítimo e
cínico.
A ministra dos Direitos Humanos, Luislinda Valois (PSDB),
é desembargadora aposentada, mulher das leis, mas, quando a lei afeta seus
interesses, aí são outros quinhentos. Como mostrou a Coluna do Estadão,
ela tentou furar o teto salarial do funcionalismo, de R$ 33,7 mil, e
acumular R$ 61,4 mil com aposentadoria e salário de ministra,
alegando que a adequação à lei, “sem sombra de dúvidas, se assemelha ao
trabalho escravo”. Logo, quis tirar vantagem com a conexão entre sua condição
de negra e a escravidão, quando o teto vale (ou deveria valer) para brancos,
negros, mulatos, asiáticos...
Curiosamente, não há registro de nenhuma manifestação de
Valois contra a portaria do trabalho escravo que mobilizou o País. Se alguém no
governo botou a boca no trombone, foi a secretária nacional de Cidadania, Flávia
Piovesan – aliás, exonerada na quarta-feira pela Casa Civil. Alegação: ela já
estava a caminho mesmo de Washington, para representar o Brasil na Comissão de
Direitos Humanos da OEA. Ah, bom!
O caso Luislinda Valois remete a um outro personagem que,
há décadas, usa a seu favor a imagem de pobre, migrante nordestino, operário
e... “de esquerda”. Sim, Luiz Inácio Lula da Silva, o inimputável, o que pode
tudo, ganhar presentes de empreiteiras, fatiar a propina da Petrobrás, ratear
estatais e fundos de pensão entre os “cumpanheiro”, jogar as culpas na mulher
já falecida, lavar as mãos diante dos erros da pupila feita presidente da
República.
Se Valois quis driblar a lei por ser negra e argumentar
contra a escravidão (dela, não dos outros), Lula sempre se pôs acima de
críticas, de regras e agora da lei porque tem a biografia que tem. E como cuida
bem dessa biografia! Em nome dela e da mítica do nordestino pobre e “perseguido
pelas elites”, ele preferiu aceitar sítio, triplex na praia e apartamento em
frente ao seu de presente, em vez de simplesmente comprá-los. Seu dinheiro
legal dava e sobrava para isso. Mas perder a aura de pobrezinho? Jamais. Esse é
o seu “trunfo”.
A mitificação vale também para o presidenciável Jair
Bolsonaro, que se faz passar por “militar” até hoje, angariando apoios e
simpatias nas bases das Forças Armadas e de saudosistas da ditadura, apesar de
estar na reserva do Exército desde 1988, como capitão, estar na política desde
1990, há quase 30 anos, e desfrutar do seu sétimo mandato como deputado
federal.
Para se consolidar no segundo lugar das pesquisas e
escamotear sua falta de condições para disputar a Presidência, o que ficou
chocantemente evidente em suas últimas entrevistas, Bolsonaro se esconde por
trás da fantasia de “militar”, da mesma forma como Lula usa a de “pobre e do
povo”, e Valois, a de “negra vítima da escravidão”.
São todas mistificações para dourar a realidade ou
“enganar um bobo, na casca do ovo”. Não um, mas milhões de bobos que não
conseguem ver que Lula, o campeão das pesquisas, é réu seis vezes, já condenado
uma vez, e deixou de ser pobre há décadas. E que Bolsonaro, o segundo colocado,
foi um militar expelido prematuramente da tropa e é um político medíocre, que
só sai do anonimato raramente e à custa de bandeiras do atraso. Só não vê quem
não quer.
*Publicado no Portal Estadão em 03/11/2017
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