Em vez do centro, o Centrão*
Racha no PSDB, saída do governo e confronto com o
PMDB implodem o centro em 2018
Eliane Cantanhêde
A saída de Bruno Araújo do Ministério das Cidades é mais
uma confirmação do que a de José Serra do Itamaraty já indicara: o sonho de boa
parte dos tucanos de reviver as glórias da transição com Itamar Franco
desfez-se melancolicamente, reavivando o ensinamento de Karl Marx de que a
história só se repete ora como tragédia ora como farsa.
Itamar também teve um início atribulado, com sucessivas
trocas de ministros da Fazenda, mas chegou ao fim do mandato com gosto de
vitória, lugar garantido na história e um candidato imbatível à sua sucessão.
Para esse resultado, ele (baiano de nascimento) contou com sua astúcia mineira
e com a participação efetiva dos políticos e economistas tucanos, liderados por
Fernando Henrique.
Michel Temer também ascendeu à Presidência por um
impeachment e com dois trunfos semelhantes ao de Itamar: alta (apesar de
disfarçada) capacidade política, aliada a uma baixa pretensão futura. Foi
assim, comparando condições e personagens, que José Serra liderou a ala tucana
favorável à tese do “quem pariu Matheus que o embale”: se o PSDB foi decisivo
ao tirar Dilma Rousseff para estancar a quebradeira do País, tinha
responsabilidade com a gestão Temer. Não poderia simplesmente aboletar-se no
conforto da arquibancada.
À constatação somou-se o cálculo político: Temer tinha os
predicados para dar certo, uma base sólida no Congresso, os quadros técnicos
tucanos e, no final das contas, boas chances de interferir ativamente na
sucessão de 2018. A favor de quem, se o PMDB tem tamanho, mas não tem nomes? Do
PSDB.
O sonho, portanto, era que Temer se transformasse num
cabo eleitoral e tanto e apoiasse o próprio Serra, por exemplo, repetindo a
relação de Itamar com Fernando Henrique. Mas sonhos são sonhos. A realidade é
muito diferente e pode virar pesadelo.
Temer não era Itamar, Serra não era FHC, não havia Plano
Real a ser inventado, a Lava Jato se voltou pesadamente contra o PMDB e as duas
denúncias de Rodrigo Janot contra o presidente fizeram o resto. Em vez de
batalhar para ser um protagonista de 2018, Temer teve de lutar para salvar o
pescoço e foi perdendo apoios no PSDB e ganhando mais e mais pressões do
Centrão.
Serra saiu de fininho do Itamaraty, acossado por dores de
coluna e revelações da Lava Jato, e a situação no PSDB inverteu-se: Serra
passou a lavar as mãos para os destinos do governo e Aécio Neves – que operado
contra a participação dos tucanos no governo – assumiu o comando da ala
favorável a continuar no primeiro escalão. Geraldo Alckmin? Esteve em cima do
muro quando o partido entrou e continua em cima do mundo quando está pulando
fora.
A demissão de Bruno Araújo abre a porta de saída do PSDB
do governo e deixa Temer à mercê do Centrão – PP, PTB, PR, PSD – dando novos
contornos para 2018. Uma coisa é um governo Temer com o PSDB, outra muito diferente
é sem ele. Assim como uma coisa é uma campanha com PSDB e PMDB do mesmo lado,
outra muito diferente é os dois concorrendo entre eles.
Temer conta com a recuperação da economia e dos empregos
para entrar em campo, firme e forte, a favor de seu candidato. Nesse caso,
ainda incerto e não sabido, Temer e o PMDB serão “players” muito importantes,
mas sem um nome considerado realmente competitivo. E o PSDB viverá uma angústia
oposta: terá um candidato forte, mas com que unidade, com quais forças
políticas, com alguma convicção de vitória?
Assim como Temer não repete Itamar, dificilmente surgirá
um novo Fernando Henrique nessa barafunda entre tucanos e tucanos, tucanos e
peemedebistas e tucanos e governo. Enquanto o PSDB racha ao meio e o centro se
pulveriza, Lula consolida sua liderança pela esquerda e Bolsonaro cristaliza
sua imagem de anti-Lula pela direita.
*Publicado no Portal estadão em 14/11/2017
Nenhum comentário:
Postar um comentário