A brisa depois do temporal*
Se o Congresso não fizer sua parte, os sinais positivos
da
economia podem se converter em luzes efêmeras
Além de uma gravíssima crise econômica e social, o País
foi obrigado a conviver nos últimos anos com uma série de eventos, de variadas
naturezas, que dificultaram enormemente a normalização da vida política, social
e econômica. Era como se o Brasil tivesse sido virado ao avesso e a cada
semana, às vezes a cada dia, aparecessem novos escândalos, novas delações,
novas denúncias.
Voltando-se no tempo, dá-se conta dos grandes obstáculos
que se interpunham à retomada da economia. Só neste ano houve a revelação do
conteúdo da delação da Odebrecht, que originou a famosa lista de Fachin, depois
veio a delação de Joesley Batista, com as investidas do então procurador-geral
da República, Rodrigo Janot, contra o presidente Michel Temer, e, mais
recentemente, revelou-se a colaboração de Lúcio Funaro. Pois bem, o País viveu
tudo isso num curto período, que culminou, para a surpresa de muitos, com a
proliferação de sinais de recuperação econômica, de melhora do mercado de
trabalho e de fortalecimento do consumo. Também é possível vislumbrar um
horizonte institucional menos conturbado, especialmente depois da troca de
comando na Procuradoria-Geral da República.
Essas novas condições precisam ser preservadas. Há muito
o País ansiava por um ambiente de normalidade, que parecia se tornar cada vez
mais distante, para não dizer impossível. Periodicamente, surgia uma nova
delação, ou uma nova interpretação de delação, desconstruindo a tão sonhada
normalidade, que é muito mais do que um simples desejo de uma parcela da
população. É condição necessária para o desenvolvimento econômico e social.
Ainda há, naturalmente, nuvens carregadas no horizonte do
País, o que demanda especial prudência por parte das autoridades. Mais do que
nunca, o País necessita de um Ministério Público centrado em sua missão
constitucional de defender a ordem jurídica. É preciso resgatar a finalidade
original da colaboração premiada. O material colhido nas delações deve deixar
de ser usado como pólvora de novos escândalos, muitos deles artificiais, para
ser aproveitado como ponto de partida de muitas investigações. Também não há
lugar na vida pública para o messianismo de alguns procuradores.
O Supremo Tribunal Federal (STF) tem também papel
fundamental nesse trabalho de normalizar o ambiente institucional do País. É
hora de rejeitar a tentação do personalismo e das interpretações alternativas.
Em vez de retardarem o desenvolvimento econômico e social, os ministros da
Suprema Corte devem assegurar as condições para a vigorosa normalização da vida
nacional, mantendo os pés firmes no bom Direito, abdicando de qualquer
pretensão de criar a lei ideal para ser tão somente seu mais fiel intérprete.
Além de contribuir para o bom ambiente econômico – afinal, insegurança jurídica
afasta investimentos –, só um STF alinhado com suas funções constitucionais
poderá dirimir com acerto as importantes questões penais de sua competência.
Depois de tantas notícias de autoridades envolvidas em práticas criminosas, é
hora de identificar as provas, punir os culpados e absolver os inocentes, numa
demonstração de que é possível combater a impunidade respeitando as garantias
processuais.
Logicamente, o ambiente mais desanuviado também traz à
tona a responsabilidade do Executivo e do Legislativo na aprovação das
necessárias reformas, especialmente a previdenciária, a tributária e, no que
ainda for possível, a política. Se o Congresso não fizer sua parte, os sinais
positivos da economia podem se converter em luzes efêmeras. Sem um ajuste
estrutural das contas públicas, só possível com a reforma da Previdência, não
há alicerce seguro para a retomada da economia e do emprego. O cumprimento pelo
Congresso de sua parcela de responsabilidade na reconstrução do País será
também a resposta mais contundente e mais efetiva aos que tentam equivocadamente
inserir todos os políticos no balaio dos corruptos.
Os tempos atuais oferecem oportunidades que há muito
estavam desaparecidas. Convém não desperdiçá-las.
*Publicado no Portal Estadão em 23/09/2017
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