Discrição e ousadia*
Caso venha mesmo a escolher o novo relator da Operação
Lava Jato, como tem sido falado nos bastidores, a presidente do STF, ministra
Cármen Lúcia, vai tirar um peso das costas do presidente Michel Temer e de quem
vier a substituir o ministro Teori Zavascki, morto na quinta-feira num acidente
aéreo, em Paraty.
João Domingos
Cármen Lúcia evita, com a decisão, que o escolhido por
Temer para o lugar de Teori chegue ao STF carregando a suspeita de que deve a
indicação a algum tipo de arranjo político feito para melar a Lava Jato. Temer,
ministros de sua roda mais próxima e parlamentares são citados em delações de
empresários negociadas com o Ministério Público. Como o regimento do STF diz
que o substituto herda os processos relatados pelo substituído, qualquer nome a
ser escolhido por Temer estaria sujeito a algum tipo de suspeita. Mas a
presidente do STF vai encaminhar outra solução para o caso da relatoria da Lava
Jato. Assim, tal situação deverá ser evitada.
A decisão de Cármen Lúcia poupa ainda o Senado de passar
por um grande vexame. Dos 81 senadores que vão aprovar a indicação do novo
ministro, 13 são investigados pela Lava Jato. Seria estranho que definissem o
nome de quem vai relatar o processo que decidirá o futuro deles. Sem contar que
assim que uma pessoa é indicada para o STF, ela vai aos gabinetes dos
senadores, um a um, para apresentar suas credenciais. Em mais de uma dezena
dessas visitas estariam frente à frente o eventual réu e o futuro julgador,
este pedindo o apoio daquele, o qual logo poderá condenar.
Estas questões são políticas. E parecem já ter encontrado
uma solução que evitará constrangimentos por todos os lados.
Fica agora no ar a expectativa de quem o presidente
Michel Temer vai escolher para o lugar de Teori. Fala-se nos bastidores do
Palácio do Planalto que será um nome técnico, para evitar especulações. Por
mais que esse técnico, de notável saber jurídico e reputação ilibada,
exigências constitucionais para que alguém chegue ao STF, seja competente, será
difícil ocupar o lugar deixado por Teori.
Nos pouco mais de quatro anos em que exerceu o cargo de
ministro do STF, Teori teve uma atuação marcada pela discrição, que alguns
qualificaram de “à moda antiga”, e pela ousadia nas decisões. Decisões jamais
tomadas por seus pares em qualquer época.
Foi dele a ordem de prisão preventiva ao então líder do
governo no Senado, Delcídio Amaral, por suspeita de atrapalhar as investigações
da Lava Jato. Teori agiu com tamanha discrição que um assunto tão bombástico
como este, da prisão de um senador em pleno mandato, jamais vazou. E a decisão
foi tão bem fundamentada que no mesmo dia o Senado fez uma sessão
extraordinária destinada exclusivamente a confirmar a sentença do
ministro.
Também foi de Teori a decisão que afastou da presidência
da Câmara e do mandato parlamentar o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Na
sentença, ele lembrou que a situação era extraordinária e excepcional. Por isso
mesmo, pontual e individualizada. Não havia risco de se estender em massa a
outros congressistas. “O imponderável é que legitima os avanços civilizatórios
endossados pelas mãos da Justiça”, justificou-se Teori na decisão. Para em
seguida dizer que, mesmo não havendo previsão específica na Constituição a
respeito do afastamento de parlamentares do mandato, no caso de Eduardo Cunha
tal situação se fazia necessária.
Com as duas sentenças Teori Zavascki mudou o curso da
História. Delcídio Amaral e Eduardo Cunha tiveram o mandato cassado e foram
parar atrás das grades. Delcídio está livre porque aceitou fazer um acordo de
delação premiada, acordo homologado por Teori.
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