Lula quer
desmoralizar o Brasil*
O herói faz agora o papel de vítima
e é assim que doravante se apresentará na grande encenação para o público,
daqui e do exterior, na qual o pérfido antagonista é a Justiça brasileira. Réu
até agora em três processos que resultaram de investigações sobre corrupção – e
na falta de sólidos argumentos de defesa –, Lula da Silva está armando um
espetáculo circense para mostrar aos desavisados que o Mal cooptou a Justiça,
que se empenha na missão abjeta de condenar um inocente, o homem “mais honesto
do Brasil”, punindo-o pelo crime de governar para os pobres.
A politização dos processos judiciais em que Lula está
envolvido como réu ou apenas investigado faz parte da estratégia concebida pelo
lulopetismo, com a assessoria de uma chusma de advogados, para desviar a
atenção da opinião pública das fortes evidências de envolvimento do
ex-presidente da República e sua família numa série de episódios suspeitos nos
quais se teriam beneficiado de tráfico de influência, de recebimento de
vantagens materiais e financeiras indevidas ou pura e simplesmente de propina.
Essa estratégia envolve também a tentativa de envolvimento dos brasileiros que
ainda apoiam o ex-presidente num clima emocional alimentado por fantasiosas
notícias sobre a iminente prisão de Lula. Na última segunda-feira, por exemplo,
algumas dezenas de pessoas, munidas de farto material de propaganda impresso,
postaram-se diante do apartamento de Lula em São Bernardo para uma “vigília
cívica” contra a “ameaça iminente” da prisão do ex-presidente.
No dia seguinte, a Folha de São Paulo publicou
artigo assinado por Lula com o sugestivo título Por que querem me
condenar. Começa por afirmar que, desde que ingressou na vida pública sua vida
pessoal foi “permanentemente vasculhada”, mas “jamais encontraram um ato
desonesto de minha parte”. Acrescenta: “Não posso me calar, porém, diante dos
abusos cometidos por agentes do Estado que usam a lei como instrumento de
perseguição política”. E explica: “Não é o Lula que pretendem condenar: é o
projeto político que represento junto com milhões de brasileiros”. E conclui,
dramaticamente: “O que me preocupa, e a todos os democratas, são as contínuas
violações ao Estado de Direito”.
Os advogados de Lula, que tentaram em vão, várias vezes,
contestar a autoridade e isenção dos magistrados responsáveis por processo em
que o ex-presidente está envolvido, voltaram à carga interpelando o desembargador
Gebran Neto, do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, relator dos recursos
da Lava Jato, a quem acusam de ter “amizade íntima” com o juiz Sergio Moro.
Segundo o ex-ministro Gilberto Carvalho, fiel escudeiro de Lula, essa nova
iniciativa obedece “à ordem de não ficar calado”, num processo permanente de
“questionamento” de tudo o que já foi ou vier a ser levantado contra Lula.
A até recentemente bem-sucedida trajetória política de
Lula foi alavancada pelo marketing. E é com o marketing que ele pretende sair
da grossa enrascada em que se meteu. Sem ter elementos concretos e convincentes
de defesa, apresenta-se como vítima dos “inimigos do povo”.
Os acontecimentos desta semana revelam, portanto, que se
pode esperar daqui para a frente a intensificação e maior contundência da
contraofensiva lulista nas áreas judicial e popular. Pode até haver quem
entenda que a prisão de Lula poderia favorecer a “causa”, na medida em que
criaria uma “enorme comoção nacional” manipulável em benefício dos “interesses populares”.
Quem conhece bem o ex-presidente sabe que esse tipo de sacrifício jamais lhe
passaria pela cabeça. É claro, portanto, que a estratégia lulista contempla
também a necessidade de manter formadores de opinião e detentores do poder
considerados confiáveis no exterior providos de argumentos políticos que sejam
úteis para a eventualidade de que se torne premente a necessidade de preservar
a liberdade de Lula. Ou seja, condenado aqui, procuraria refúgio em regime
amigo, apresentando-se, assim, como exilado político.
O homem está disposto a pagar qualquer preço por todas
essas precauções. Inclusive o de tentar desmoralizar a Justiça e de apresentar
o Brasil, aos olhos da opinião pública mundial, como uma reles ditadura. Mas
esse ato de desespero lhe será cobrado pela consciência cívica do País.
*Publicado no Portal Estadão em 20/10/2016
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