R$ 5 bi de empréstimo a empreiteiras do petrolão
Por qualquer ângulo que se observe, a conclusão é a mesma. As empreiteiras envolvidas no petrolão mandaram e desmandaram nos governos de Lula e Dilma Rousseff. Uma parceria em que os dois lados ganhavam muito. Só na Petrobras, ganharam 40 bilhões de reais. Ganharam muito também no BNDES, na Eletrobras, no Dnit… O Tribunal de Contas da União (TCU) acaba de descobrir um novo filão. Sem qualquer fiscalização, sem qualquer controle, as empreiteiras que pagavam milionários subornos a dirigentes do PT receberam mais de 5 bilhões de reais em empréstimos do Fundo da Marinha Mercante.
O fundo é gerido pelo Ministério dos Transportes. Os
empresários que desejam obter recursos precisam conseguir uma autorização
especial da pasta. Só depois de conseguir essa autorização é que as empresas
podem apresentar proposta para captar os recursos no Banco do Brasil, na Caixa
Econômica Federal ou no BNDES. Apesar de ser capitalizado a partir dos recursos
da cobrança de impostos da navegação comercial, nos governos do PT, o fundo
passou a ser abastecido quase inteiramente por aportes bilionários do Tesouro
Nacional.
Pelo menos sete estaleiros formados por empreiteiras
investigadas na Operação Lava-Jato foram contemplados com os empréstimos.
Formado pelas empreiteiras Camargo Corrêa e Queiroz Galvão, o Estaleiro
Atlântico Sul, por exemplo, recebeu 2,7 bilhões de reais. O estaleiro Enseada,
liderado pela Odebrecht, UTC e OAS, obteve 950 milhões de reais. O Estaleiro
CQG, integrado pela Construtora Queiroz Galvão, contraiu 731 milhões de reais.
E o estaleiro ERG2, da Engevix, outros 625 milhões de reais.
O TCU descobriu que houve ausência completa de
transparência no processo de concessão de empréstimos e falta de controle dos
recursos. Apesar de ter liberado quase 50 bilhões de reais no período, toda a
contabilidade do fundo é feita de forma amadora, a partir de simples planilhas
de Excel, “o que não fornece o grau de confiabilidade que seria esperado para
se acompanhar a aplicação de recursos financeiros de tal magnitude”, registra o
despacho assinado pelo ministro Augusto Nardes, responsável pela fiscalização.
Os técnicos perguntaram ao governo por que não foi desenvolvido um sistema de
controle adequado para monitorar os bilhões do fundo. A resposta: falta de
recursos.
Durante o segundo governo Lula, o Fundo da Marinha
Mercante foi convertido em um bilionário instrumento de concessão de
empréstimos a pretexto de “estimular a indústria naval”. O levantamento mostra
que, durante os governos de Lula e Dilma, a concessão de empréstimos a empresas
disparou. Foi de 465 milhões de reais, em 2005, para 4,4 bilhões de reais, em
2014. Em 2006, a liberação de empréstimos era de 893 milhões de reais. Após a
reeleição de Lula, chegou a 9 bilhões de reais em 2007. Já em 2010, ano da
eleição de Dilma Rousseff, os repasses do fundo bateram novo recorde, chegando
a 10,6 bilhões de reais.
As empresas que recebem recursos do fundo têm uma série
de vantagens, como carência de até quatro anos para começar a pagar e prazo de
até 20 anos para amortizar o empréstimo, além de condições especiais de juros
no caso do uso de itens nacionais. O TCU constatou que, apesar de envolver
cifras bilionárias – entre 2005 e 2014, o fundo liberou quase 50 bilhões de
reais –, todo o processo de concessão de empréstimos do fundo é uma verdadeira
caixa-preta. “Não existe na página de internet do Ministério dos Transportes um
local específico em que fiquem publicadas as pautas das reuniões do Conselho
Diretor do Fundo da Marinha Mercante, as priorizações concedidas, valores,
beneficiários, contratos de financiamento assinados, andamento dos contratos em
execução e obras concluídas”, registra o relatório.
Pelas regras, a empresa que pretende receber dinheiro
público precisa provar ao banco estatal que o projeto financiado é viável
economicamente e que ela, a empresa, tem condições de honrar o compromisso
assumido. No caso dos empréstimos do Fundo da Marinha Mercante, o risco de
calote é todo da União. Ironicamente, até existe um fundo de garantia usado
pelas empreiteiras, uma espécie de seguradora, para cobrir o risco dos bancos
estatais no caso de as empreiteiras não devolverem o dinheiro público que
pegaram emprestado. Ocorre que o fundo é mantido inteiramente por dinheiro
público. Ou seja, em caso de calote, a conta será apresentada aos brasileiros.
Um desfecho que parece cada vez mais inevitável ante a paralisação de obras, a
quebradeira dos estaleiros e a demissão em massa de trabalhadores.
Como mostra a auditoria do TCU, realizada a pedido do
senador Alvaro Dias (PV-PR) e encaminhada ao Congresso recentemente, o
principal objetivo dos estaleiros do petrolão que captaram recursos do
Fundo da Marinha Mercante era construir os navios-sonda que seriam usados pela
Petrobras para suprir a demanda de exploração de petróleo na camada
pré-sal. O negócio multibilionário seria realizado a partir da empresa Sete
Brasil, uma sociedade formada por banqueiros e fundos estatais, que
encomendaria os navios aos estaleiros financiados pelo fundo. Ocorre que a Sete
Brasil tornou-se um cadáver insepulto após a Lava-Jato descobrir sua real
função de atuar como uma “filial do petrolão” ao mascarar as fraudes realizadas
entre empreiteiros e políticos corruptos. Em dificuldades financeiras, boa
parte dos estaleiros que captaram recursos do fundo terão de renegociar os
empréstimos. E aí mora o perigo.
Fonte: Publicado na veja.com em 17/08/2016
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