Simples e profunda*
Antes, o presidente interino Michel Temer já havia sinalizado, de um
Executivo que busca implementar necessárias mudanças no país (política,
econômica e fiscal) para um Congresso que ainda reluta a abandonar o crônico
paradigma do excesso de fisiologismo, quais os pontos mais imediatos de uma
reforma política simples, como deve ser, mas não menos profunda: a adoção de
uma cláusula de desempenho para os partidos e a proibição de coligações nas
eleições proporcionais.
A oportuna particularidade de, no espaço de poucos dias, os chefes do
Executivo e de uma das Casas do Legislativo terem mostrado sintonia num tema
vital para o futuro político do país não pode ser desperdiçada. A degradação do
sistema de representação do país passa não só pelos gargalos mais visíveis,
expressos em mecanismos que perpetuam o jogo do toma lá dá cá. Nela há também
um inequívoco componente cultural, na forma de parlamentares que disputam
eleições para, ao anteparo de seus mandatos, obter dividendos materiais. Neste
particular, esta não é uma exclusividade do Brasil. Corrupção política, em
maior ou menor grau, existe em todo o mundo. O que lhe dá no país a dimensão de
“malfeitos” levados ao extremo são os dispositivos — legais mas deletérios —
que, na prática, a “institucionalizam”.
A proliferação própria de um sistema como o brasileiro, que não impõe
critérios realistas para o funcionamento das legendas, é uma grande mola a
impulsionar práticas deletérias como o fisiologismo e o clientelismo, as faces
mais visíveis da corrupção política. E, ainda que se abstraia esse aspecto —
num esforço de apequenamento do papel da política na vida do país —, é
impossível que a pulverização represente, sem redundância, o arco de opiniões
da sociedade e que negociações políticas envolvendo 28 partidos sejam
produtivas. No caso das coligações, o efeito mais nocivo está no fato de o
eleitor votar num candidato e eleger outro, não raro sem qualquer afinidade
ideológica.
O correto, na reforma sugerida por Temer e, espera-se, a ser abraçada
por Maia seria criar uma barreira pela qual a legenda se veria obrigada a
atrair 5% dos votos nacionais, sendo 2% em pelo menos nove estados, para ter
assento na Câmara. Em 2006, uma cláusula de desempenho foi posta nestes termos
para o STF apreciar. Na época, o Supremo a barrou — equívoco que agora, por
certo, em face do novo perfil da Corte, não se repetiria. Mas que hoje o
Legislativo pode, e deve, vir a desfazer no Congresso, pela sanidade do futuro
político do país.
*Publicado no jornal O Globo em 18/07/2016
Nenhum comentário:
Postar um comentário