As pedaladas em detalhes*
A comissão especial do impeachment do Senado iniciou esta
semana a etapa de oitiva de testemunhas. E bastou a primeira sessão dessa nova
fase – quando testemunhas da acusação responderam a questões dos senadores
sobre os crimes de responsabilidade imputados à presidente Dilma Rousseff –
para jogar por terra qualquer tentativa de insinuar a existência de um golpe no
País.
Conforme amplamente explicado pelas testemunhas, a presidente Dilma
Rousseff infringiu conscientemente a Lei de Responsabilidade Fiscal, o que
configura crime – motivo mais que suficiente para justificar seu impeachment.
Júlio Marcelo de Oliveira, procurador do Ministério
Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), e Antonio Carlos D’Ávila
Carvalho, auditor do TCU, afirmaram que a presidente Dilma Rousseff sabia que,
com as pedaladas fiscais e a edição de decretos de créditos suplementares
assinados sem autorização do Congresso Nacional, ela violava a Lei de
Responsabilidade Fiscal e a lei orçamentária.
Conforme explicou D’Ávila, a edição de um decreto em
discordância com a lei orçamentária é infração gravíssima. “Se você estava em
situação de déficit, o que seria compatível naquele momento era um
encaminhamento de um projeto de lei ao Poder Legislativo para que ele pudesse
participar também da decisão sobre aquela despesa”, afirmou o auditor do TCU.
Em resposta ao senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que
tentava insinuar que teria havido mudança de jurisprudência por parte do TCU, o
procurador Júlio Marcelo esclareceu que o tribunal nunca endossou a edição de
decretos de suplementação de créditos em descompasso com a meta fiscal. “Não há
decisão anterior do TCU que considerasse decretos de abertura de suplementação
de créditos sem observância da meta fiscal. E, portanto, não há que falar em
nova jurisprudência para retroagir e convalidar irregularidades passadas. O que
havia antes e continua existindo é a Constituição, a Lei de Responsabilidade
Fiscal e as leis orçamentárias de cada ano, que devem ser observadas
independentemente de uma manifestação do TCU sobre o tema.”
Na sessão também se pôde esclarecer o equívoco – tantas
vezes repetido pela defesa da presidente Dilma Rousseff – de que as pedaladas
fiscais eram corriqueiras em outros governos. D’Ávila afirmou que as operações
de crédito realizadas junto ao Banco do Brasil no governo Dilma – que
contrariam a Lei de Responsabilidade Fiscal – foram inéditas na gestão fiscal
do País.
Para Júlio Marcelo, há relação direta entre a crise
econômica que o País vive e as pedaladas fiscais. “O artifício que foi
utilizado para a expansão do gasto fiscal implicou no aumento da dívida pública
não conhecida da sociedade, porque foi maquiado pela omissão do Banco Central
do Brasil. Implicou na perda de confiança dos agentes econômicos nos números e
no futuro da economia e a perda do grau de investimento do Brasil pelas
agências de classificação de risco”, afirmou o procurador.
Na sessão, também foram ouvidos Adriano Pereira de Paula,
coordenador de operações de crédito (Copec) do Tesouro Nacional, e Otávio
Ladeira de Medeiros, secretário do Tesouro Nacional. Adriano Pereira de Paula
observou que as orientações ao Tesouro sobre o repasse de recursos ao Banco do
Brasil para subsidiar empréstimos do Plano Safra vieram de autoridades da área
econômica do governo da presidente Dilma Rousseff.
Ainda que óbvio, esse ponto é importante porque contesta
a falaciosa defesa de Dilma Rousseff, que afirma que ela não era responsável
pela gestão das finanças públicas do País. Como esclareceu o coordenador do
Copec, as ordens para atuar de forma contrária à Lei de Responsabilidade Fiscal
vinham da equipe econômica da presidente.
Abundantes, os fatos mostram que a presidente Dilma
Rousseff, ao infringir conscientemente a legislação orçamentária, cometeu crime
de responsabilidade. Ficar repetindo que há golpe é mais que ignorância – é
má-fé.
*Publicado no Estadão.com em 10/06/2016
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