Molecagem*
Na iminência de ser desalojada do
Palácio do Planalto, a petista Dilma Rousseff parece disposta a reafirmar, até
o último minuto de sua estada no gabinete presidencial, a sesquipedal
irresponsabilidade que marcou toda a sua triste trajetória como chefe de governo.
Até aqui, a inconsequência de Dilma
podia ser atribuída, com boa vontade, apenas a sua visão apalermada de mundo,
que atribui ao Estado o poder infinito de gerar e distribuir riqueza, bastando
para isso a vontade “popular”, naturalmente representada pelo lulopetismo.
Agora, no entanto, ciente de que não escapará da destituição constitucional,
justamente porque violou a Lei de Responsabilidade Fiscal, Dilma resolveu
transformar essa irresponsabilidade em arma, com a qual pretende lutar contra o
Brasil enquanto ainda dispuser da caneta presidencial.
A presidente prepara um pacote de
“bondades”, quase todas eivadas do mesmo espírito populista que tanto mal tem
feito ao País. A ideia da petista é obrigar o novo governo, presidido por
Michel Temer, a assumir o pesado ônus político de tentar anular algumas dessas
decisões, que claramente atentam contra as possibilidades do Orçamento.
Um exemplo é a concessão de um
reajuste do Bolsa Família. Articulada pelo chefão petista Luiz Inácio Lula da
Silva, a medida deverá ser divulgada por Dilma para celebrar o Dia do Trabalho,
amanhã. Não é uma mera “bondade”. Trata-se de uma armadilha para Temer.
O próprio Tesouro avalia que não há
nenhuma possibilidade de conceder reajuste para os beneficiários do Bolsa
Família sem, com isso, causar ainda mais estragos nas contas públicas. O
secretário do Tesouro, Otávio Ladeira de Medeiros, disse que não há “espaço
fiscal” – isto é, recursos no Orçamento – para o aumento.
Segundo Medeiros, o Orçamento tem uma
margem de R$ 1 bilhão para reajustar o Bolsa Família, mas a extrema penúria das
contas da União não permite que se mexa nesse valor enquanto o Congresso não
aprovar a nova meta fiscal – o governo quer aval para produzir um déficit de
até R$ 96,95 bilhões no ano. Sem essa autorização, e diante da perspectiva de
nova queda da receita, a Fazenda reconhece que será necessário fazer um
contingenciamento orçamentário ainda maior, o que inviabiliza o reajuste do
Bolsa Família.
Essa impossibilidade, aliás, foi
prevista pela própria Dilma. Ao sancionar a Lei de Diretrizes Orçamentárias de
2016, nos últimos dias do ano passado, a petista vetou os reajustes de todos os
benefícios do Bolsa Família. A previsão era de um aumento de ao menos 16,6%,
correspondente ao IPCA acumulado de maio de 2014 – data do último reajuste do
Bolsa Família – a novembro de 2015. Ao justificar o veto, Dilma escreveu que “o
reajuste proposto, por não ser compatível com o espaço orçamentário, implicaria
necessariamente o desligamento de beneficiários do Bolsa Família”.
Agora, no entanto, Dilma mandou às
favas o que havia restado daquela prudência, com o único objetivo de sabotar
Michel Temer. Sem ter autorização para mais gastos, o governo terá de fazer
novos cortes até o final de maio – quando se espera que o País já esteja sendo
governado pelo peemedebista –, e então qualquer liberação de dinheiro adicional
para pagar um Bolsa Família reajustado poderia representar o mesmo crime de
responsabilidade pelo qual Dilma está sendo acusada.
Atitudes como essa fazem parte de um
conjunto de decisões indecentes que Dilma resolveu tomar para travar sua guerra
particular contra o País. Sempre sob orientação de Lula, o inventor de postes,
Dilma escancarou seu gabinete para os líderes das milícias fantasiadas de
“movimentos sociais”, fazendo-lhes todas as vontades e concedendo-lhes
benefícios com os quais Temer terá de lidar. Enquanto isso, mandou seus
ministros se recusarem a colaborar com os assessores de Temer e reforçou sua
campanha internacional para enxovalhar a imagem do Brasil no exterior,
caracterizando o País como uma república bananeira. E esse espetáculo grotesco
não deve parar por aí.
Eis o tamanho da desfaçatez de Dilma
e de Lula. Inimigos da democracia, eles consideram legítimo aprofundar a crise
no Brasil se isso contribuir para a aniquilação de seus adversários. Isso não é
política. É coisa de moleques.
*Publicado no Estadão.com em 30/04/2016
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