O poder da Odebrecht na Petrobras
A análise de documentos em poder da Polícia Federal, que integram
um dos inquéritos da Operação Lava-Jato que investigam a construtora Odebrecht,
comprova declarações de delatores de que a maior empreiteira do país tinha
acesso a informações privilegiadas da Petrobras e o poder de influenciar
licitações da estatal. É o que mostra cruzamento feito entre e-mails trocados
por diretores da empreiteira, apreendidos na investigação, e contratos de uma
das principais obras da estatal no país: a Refinaria Abreu e Lima, em
Pernambuco.
A
influência de executivos da Odebrecht em uma das licitações da refinaria
culminou num “teatro”, nas palavras de um dos diretores grampeados, para que o
então presidente Luiz Inácio Lula da Silva posasse entre tratores e colhesse
dividendos políticos com a obra.
Em
pelo menos duas mensagens de 2007, Rogério Araújo, então diretor da Odebrecht,
hoje preso da Lava-Jato, traça uma estratégia para a participação da
empreiteira na licitação para as obras de terraplanagem de Abreu e Lima, a
partir de informações que teria obtido na estatal sobre o “orçamento interno”
do projeto. A comparação dos e-mails com a cronologia da contratação do serviço
revela que, naquele momento, o “orçamento interno” era uma informação
confidencial da Petrobras, cuja obtenção permitiria às concorrentes fraudar a
licitação.
A
concorrência para as obras de terraplanagem do terreno onde foi instalada a
refinaria foi aprovada pela diretoria da Petrobras no dia 3 de maio de 2007, de
acordo com documentos internos. No dia 10 de maio, a companhia convidou dez
participantes. Pouco mais de um mês depois, no dia 18 de junho, Araújo enviou
um e-mail para outros dois executivos da empreiteira relatando saber que o
“orçamento interno” da Petrobras ficaria entre R$ 150 milhões e R$ 180 milhões,
cifra que ele diz “que obviamente não dá”, por considerar muito abaixo da
remuneração obtida no mercado para empresas por obras semelhantes.
Segundo a reprodução das mensagens no relatório da PF, Rogério
Araújo indica que queria mais do que o dobro. Ele avisa que falou com
“interlocutores” e que “Engenharia” (uma provável referência à Diretoria de
Serviços e Engenharia, de Renato Duque, também preso na Lava-Jato) já
trabalhava na revisão do orçamento, como queria a Odebrecht. “A revisão do
orçamento vai indicar um novo número, acima dos indicados acima”, antecipa. No
texto, o diretor da empreiteira ainda registra que o valor só seria público na abertura
das propostas, que aconteceria quatro dias depois.
No
dia 22 de junho, a Petrobras recebeu seis propostas. A menor foi justamente a
do consórcio liderado pela Odebrecht (com Camargo Corrêa, Galvão Engenharia e
Queiroz Galvão, todas investigadas na Lava-Jato), de R$ 433,5 milhões. Segundo
documento da diretoria da Petrobras, que aprovou a contratação do consórcio em
12 de julho de 2007, o valor ficou apenas 5,32% abaixo do novo “orçamento
interno” da estatal. Araújo, ao que parece, logrou êxito: o valor estimado pela
estatal, revelado quatro dias depois da troca de mensagens na Odebrecht, foi
maior do que o dobro dos R$ 180 milhões que ele citou.
"Teatro para Lula"
Lula e Hugo Chaves "encenando" na Abreu e Lima |
O
fácil acesso a informações da Petrobras fica claro em outro e-mail de Araújo,
sobre uma cerimônia simbólica do início do contrato no terreno onde seria
construída a refinaria, em Pernambuco, com a presença do então presidente Lula.
Araújo explica que a assinatura do contrato se daria no Rio, mas que seria
preciso criar um cenário de obra em andamento para Lula, no Recife, em meio a
tratores e máquinas. “Vai haver uma solenidade no Recife, no dia 16 de agosto,
para dar início aos serviços de terraplenagem, com a presença do presidente
Lula. Neste dia, teremos que ter alguns equipamentos já mobilizados, para fazer
parte do ‘teatro’!”
A
cena montada pela Odebrecht atrasou 19 dias. No dia 4 de setembro, Lula
discursou sob intensa chuva no palanque montado pela construtora ao lado do
então presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli. Animado pelo gigantismo
da refinaria, Lula comparou o empreendimento à construção da Muralha da China.
“Temos uma verdadeira muralha da China para construir e vamos construir”,
prometeu. (Fontes/ G1/O Globo)
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