Um remédio perigoso
O ESTADO DE S.PAULO
21 Janeiro 2015
Com o
aumento de impostos começou a parte mais dolorosa do ajuste fiscal. O ideal
seria cortar o gasto, mas essa hipótese está descartada. Seria muito difícil,
ou mesmo impossível, segundo alguns analistas, arrumar as contas públicas,
nesta altura, somente com a redução do dispêndio. O governo pode ter tido bons
motivos e razões técnicas ponderáveis para sua decisão, mas uma ressalva é
necessária. O aumento efetivo será maior do que pode parecer inicialmente. O
assalariado, mais uma vez, terá de suportar uma elevação disfarçada do Imposto
de Renda.
A mudança da tabela
será insuficiente para compensar a inflação e os ajustes de salários. Muitos
trabalhadores terão de pagar mais simplesmente porque conseguiram, em suas
negociações, uma compensação para a alta de preços.
A presidente Dilma Rousseff
decidiu vetar a atualização de 6,5%. A correção defendida pelas autoridades, de
4,5%, será bem inferior à necessária - quase um confisco. Mas isso faz parte,
há muito tempo, da política fiscal.
É mais fácil de
defender os demais aumentos anunciados pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy,
mas com algumas condições. Além de buscar maior arrecadação, o governo deve
fazer um esforço real e perceptível para conter e racionalizar gastos. Além
disso, a elevação de tributos tem de ser provisória. No Brasil, os governos
tendem a se acomodar e a tornar permanentes medidas justificáveis apenas como
soluções de emergência. O exemplo mais notório é o da malfadada CPMF.
O aumento do Imposto
sobre Operações Financeiras (IOF) cobrado sobre empréstimos a pessoas físicas
poderá reforçar a arrecadação, mas, ao mesmo tempo, funcionará como desestímulo
à procura de crédito. A medida servirá para conter a demanda de consumo,
reforçando a política de juros do Banco Central (BC), e para aumentar a
arrecadação do Tesouro, porque, apesar do custo maior, parte dos consumidores
continuará buscando financiamento.
A elevação da Cide
sobre combustíveis deverá pressionar a inflação e, ao mesmo tempo, estimular
maior parcimônia nos gastos com transporte pessoal. O aumento do diesel afetará
também os custos de produção e de transporte de mercadorias e atingirá,
portanto, a oferta de bens e serviços. É uma saída ruim, num país dependente do
transporte rodoviário.
Num país com
produtividade estagnada e baixo poder de competição, todo aumento de custos é
especialmente prejudicial à economia - bem mais do que seria num cenário de
muita eficiência produtiva e elevado poder de competição. Além disso, o
problema da tributação mal aplicada é agravado, no Brasil, pelo peso do imposto
estadual incidente sobre a circulação de combustíveis e de energia elétrica.
O aumento da
tributação sobre cosméticos pode parecer pouco danoso, por afetar os preços de
uma classe de produtos considerados supérfluos. Talvez se possa consolar o
consumidor com esse argumento meio moralista, mas bens e serviços classificados
como supérfluos também resultam de atividades produtivas e geradoras de emprego
tanto nas fábricas quanto nos serviços de logística e de comercialização. Para
o funcionário de uma fábrica de cosméticos, seu emprego e seu salário estão
longe de ser dispensáveis ou menos importantes que quaisquer outros. De toda
forma, pelo menos para o consumidor, essa elevação de imposto pode ser menos
danosa do que outras.
A elevação de
tributos sobre importados pode até ser aplaudida por uma parte do público, mas
também produz importantes efeitos negativos. Torna mais fácil a majoração de
preços e, se mantida por muito tempo, contribui para a acomodação dos setores
mais protegidos. Tanto empresários quanto assalariados tendem a apoiar medidas
protecionistas e a trabalhar por sua manutenção, pressionando o governo e os
políticos capazes de influenciar a formulação da política econômica.
Promover o aumento
da eficiência produtiva e favorecer os ganhos de competitividade foram
objetivos anunciados pelo ministro Joaquim Levy logo depois de oficializada sua
escolha pela presidente Dilma Rousseff. Será difícil de atingir essas metas com
o atual sistema tributário. Sua reforma, adiada há muito tempo, é cada vez mais
necessária. O quadro ficará bem mais complicado se as novas medidas forem
mantidas por inércia ou por pressão e certos setores se incorporarem a um
esquema já muito ruim.
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