O que o povo vai achar disso?
Vinicius Torres Freire
Ao
fim deste ano, os brasileiros estarão em média mais pobres. A renda nacional, o
PIB, terá crescido menos que a população. A renda, o PIB per capita, vai cair.
Havia acontecido em 2009, ano de colapso mundial. Antes, no 2001 de apagão e
outras crises. Além disso, em 2014 o consumo das famílias terá crescido no
ritmo mais lento em uma década.
2015
vai ser meio assim, e mais. O povo terá de engolir um tanto mais de inflação e
a primeira alta notável do desemprego desde 2003. Enquanto mastiga essa
gororoba, deve assistir à estreia do "reality" do Petrolão dos
políticos, entre outras indignidades de um Congresso em rebuliço.
Seria
uma conjunção inédita de más notícias em mais de uma década. Não faltará quem
queira superfaturar o clima econômico ruim, a barafunda político-criminal e o
fato de tudo isso ocorrer enquanto Dilma Rousseff troca a roupa de sua política
econômica em público, estreando o modelo que durante a campanha eleitoral
prometera deixar no armário: o "ajuste duro".
A
queda da renda per capita pode não parecer impressionante. O PIB é uma
abstração. De ano para outro, pode não dizer grande coisa sobre a
"economia da vida cotidiana", a sensação térmica do povo. O declínio
do consumo das famílias, no entanto, vai dando concretude triste a estes anos
de estagflação moderada. Pior ainda será o efeito de um aumento de desemprego.
A
tendência da taxa de desemprego em geral foi de baixa desde 2003, com pequenos
e breves repiques em 2006 e 2009, que, no entanto, ocorreram em outro ambiente,
de melhora contínua da vida. Não vai ser o caso em 2015, embora não se preveja
crise como as vividas até 2003. Ainda assim.
Há
um risco razoável de inflação na casa de 7% ou mais. Meio ponto extra de
inflação talvez não seja muito notável no dia a dia, em particular se não se
trata de carestia da comida. Mas estão na fila reajustes chatos como os de
ônibus, trem, água, luz, gasolina, para nem mencionar que virá alguma alta de
imposto. Haverá o aumento de IPTU em São Paulo, onde o clima não está bom faz
tempo, vide junho de 2013 e os votos na oposição a Dilma.
As
"Bolsas" sociais vão crescer menos. Os juros de curto prazo e os dos
crediários serão maiores. Mesmo o dólar, que se mudou de vez para patamar mais
alto, vai contribuir para a sensação de empobrecimento, que pelo menos no curto
prazo será em parte decorrência disso que o Banco Central chama de
"realinhamento de preços relativos". Isto é, bens manufaturados
tendem a ficar algo mais caros, haverá menos emprego e salário nos serviços,
tarifas públicas serão reajustadas com mais rapidez.
Enfim,
recorde-se que as expectativas de melhoria socioeconômica têm estado elevadas
desde o final da década passada. Há uma geração de pessoas que se tornou adulta
nesse ambiente mais esperançoso. Mesmo que o caldo não entorne demais, a panela
meio cheia vai parecer mais vazia.
Essa
conjunção de problemas não é fatal, destino, tumulto inevitável. A reestreia de
Dilma pode inspirar confiança; pode haver melhora do humor econômico da elite e
da "velha" classe média. O governo pode saber conversar politicamente
com a população. Mas vai ser tenso.
Publicado no jornal Folha de São Paulo - 1º/12/14
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