O que vem
por aí é um plebiscito
Elio Gaspari*
Quando Marina Silva não conseguiu chegar ao segundo turno,
atribuiu-se seu declínio à pancadaria que sofreu. Talvez nunca se saiba por que
o balão esvaziou, mas, mesmo olhando-se para os golpes que levou, essa teoria é
curta. Foi de sua equipe que partiu a plataforma da independência do Banco
Central. Admita-se que a ideia pode ser boa. Ainda assim, ela foi exposta pela
educadora Neca Setubal, herdeira da família que controla o banco Itaú.
Precisava? Se isso fosse pouco, dias depois, Roberto, irmão de Neca e
presidente da casa bancária, disse que via “com naturalidade” uma possível
eleição de Marina. Precisava? Marina falou em “atualizar” a legislação
trabalhista, mas não detalhou seu projeto. Juntando-se gim e vermute, tem-se um
Martini. Juntando-se banqueiro com atualização das leis trabalhistas, produz-se
agrotóxico. Precisava?
Uma
campanha eleitoral em que se discutiram mais as pesquisas do que as plataformas
esteve mais para videogame do que para escolha de um presidente da República,
mas foi esse o curso que ela tomou. A comparação do resultado do primeiro turno
com as estimativas das pesquisas ensinou o seguinte: os votos de Aécio Neves
ficaram acima da expectativa máxima e os de Dilma, abaixo da expectativa
mínima. Disso resulta que não só é temerário dizer quem está na frente, mas é
arriscado afirmar que o vencedor será eleito por pequena margem.
Os
eleitores prestam atenção em pesquisas, mas votam com o coração, a cabeça e o
bolso. Se a noção demofóbica segundo a qual Dilma tem o voto dos pobres tivesse
alguma base, a doutora estaria eleita. Contudo, olhando-se pelo retrovisor,
nunca houve ricos suficientes nos Estados Unidos e na Inglaterra para eleger os
conservadores Ronald Reagan e Margaret Thatcher. Como muita gente achava que o
povo brasileiro não sabia votar, o país foi governado por cinco generais
escolhidos sem qualquer participação popular. O último foi-se embora deixando
uma inflação de 226% e uma dívida externa (espetada) de US$ 180,2 bilhões.
Os
candidatos conseguem votos pelo que dizem e pelo que fazem. Em 1994, Fernando
Henrique Cardoso percebeu que ganhara a eleição quando uma mulher ergueu uma
nota de um real durante um comício. Quatro anos depois, mesmo diante da ruína
da fantasia do real que valia um dólar, ele foi reeleito porque os brasileiros
preferiram continuar numa Mercedes que rateava a embarcar na motocicleta de
Lula.
Nesta
campanha, com exceção do debate da Record, os outros foram rasos. Em todos, os
candidatos pareciam drones guiados pelo controle remoto dos marqueteiros,
buscando clipes para os programas do horário gratuito. Sexta-feira, o debate da
Globo terá tudo para ser educativo, pois nele o jogo do clipe será inútil.
A
pancadaria que envolveu Dilma Rousseff e Aécio Neves roncou dos dois lados.
Ambos sabiam que esqueletos tinham nos armários. As baixarias não serão
suficientes para explicar o resultado que sairá das urnas. Muito menos as
teorias destinadas a desqualificar os votos de quem vier a prevalecer. O que
vem por aí é um plebiscito para decidir se o PT deve continuar no governo ou
ir-se embora.
*Elio Gaspari é jornalista
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