terça-feira, 14 de janeiro de 2020



Muito barulho

A inflação de 2019 foi de 4,31%, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), levantado pelo IBGE. A meta do Conselho Monetário Nacional ficava entre 2,75% no mínimo e 5,75% no máximo. A inflação ficou, portanto, no centro da meta.

O centro da meta, rigorosamente, era 4,25%. A diferença de um acerto no centro absoluto do alvo foi de 0,06 – seis centésimos de ponto percentual. Se fosse um concurso de tiro ao alvo, a política monetária receberia uma medalha. E a causa de o tiro ficar seis centésimos acima do centro absoluto do alvo é justa: foi a pressão da demanda de dezembro, mostrando um reaquecimento da economia. Quer dizer, só boas notícias.

Por que então fizeram tanto barulho, abrindo manchetes a dizer que o dragão da inflação voltou, que ultrapassou a meta e outros catastrofismos? Suponho que seja pelo princípio do “o que é ruim a gente mostra; o que é bom a gente esconde; se não houver ruim a gente inventa”.

Num tempo em que se condenam as fake news, isso é um risco sério para quem depende de credibilidade para ter leitores e audiência. Mas é a síndrome do escorpião: afunda junto com o sapo que ferrou, mas é da sua natureza. Tentar apagar o otimismo renascente é ato de masoquismo, porque se não houver a força da economia, todos faturam menos, pagam menos e quebram mais.

No mês de dezembro, a inflação de 1,15%, a maior de um mês para o ano, é um termômetro do aquecimento que entra 2020, com meta de inflação fixada em 5,5% no máximo e 2,5% no mínimo, com centro em 4% a.a.

Em meus anos de repórter de Economia, lembro-me bem dos efeitos de uma inflação de 84% ao mês e 5.000% ao ano. Hoje, menos de 5% a.a. é uma demonstração do que o Brasil pode fazer. Também poderemos crescer como na década dos anos 70, na média anual de 8,78% ao ano – um crescimento chinês, de novo na base do otimismo e do entusiasmo.

É cheia de consequência políticas e eleitorais a advertência do assessor de Bill Clinton, na campanha vitoriosa de 1992: “É a economia, estúpido”. Quando a economia vai bem, a população vai bem, o país vai bem e o governo recebe os méritos. Identificado esse fator, os opositores precisam reduzir seus efeitos, mesmo com o sacrifício do país, procurando reduzir o otimismo, fazendo o barulho que fizeram.

Shakespeare, há quase 500 anos, escreveu “Muito Barulho por Nada”. Foi a mais divertida comédia do Bardo. Quando gente, como o escorpião, quer afundar nesta travessia o barco em que todos estamos, fica parecendo mais uma comédia.

Alexandre Garcia



Militares da reserva podem atuar na
força-tarefa para reduzir fila do INSS
O governo federal quer recrutar militares da reserva para integrar a força-tarefa para reduzir a fila do INSS. A proposta é que eles assumam funções de atendimento nas agências do órgão, enquanto servidores trabalham na verificação. Atualmente, 1,3 milhão de pedidos por benefício estão sem análise há mais de 45 dias -, prazo legal para uma resposta do órgão. A possibilidade de recrutar militares inativos é prevista na lei que reestruturou o regime dos militares. O pagamento será feito pelo próprio INSS e o custo mais barato do que a contratação de terceirizados. As Forças Armadas têm um contingente de mais de 150 mil reservistas.

Bolsonaro cita “brecha” para novo reajuste do salário mínimo
Um novo reajuste do salário mínimo será debatido pelo presidente Jair Bolsonaro com o ministro da Economia, Paulo Guedes, nesta terça-feira (14). O objetivo é repor toda a inflação de 2019. Inicialmente, o governo usou a previsão de um valor no INPC, no entanto em dezembro foi superior devido a alta no preço da carne. Com isso, o salário mínimo pode passar de R$ 1.039 para R$ 1.045. "Vou me reunir com o Paulo Guedes agora a tarde. Eu acho que tem brecha para a gente atender. É porque a inflação de dezembro foi atípica por causa do preço da carne", disse Bolsonaro.

Projeto prevê pena de até três anos
para crime de perseguição ou stalking
Um projeto de Lei (1369/19) que tramita no Congresso Nacional prevê pena de seis meses até três anos para crime de perseguição ou stalking – um tipo de violência em que a vítima tem a privacidade invadida fisicamente, por ligações, mensagens ou pela internet. A proposta, que já foi aprovada pelo Senado, altera o Código Penal para definir crime essa prática, por meio físico e também eletrônico. A autora, senadora Leila Barros (PSB-DF), sugere ainda no texto a obrigatoriedade de a autoridade policial informar, com urgência, ao juiz, quando for instaurado o inquérito sobre perseguição. Na Câmara dos Deputados, o projeto ainda será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania e, na sequência, pelo plenário.

Para Bolsonaro, “Democracia em Vertigem” é ficção e “porcaria”
O presidente Jair Bolsonaro disse, nesta terça-feira (14), que o documentário brasileiro indicado ao Oscar 2020, "Democracia em Vertigem", é uma obra de ficção. Ao deixar o Palácio da Alvorada, o presidente foi questionado se tinha algum comentário sobre a indicação. "Ficção. Para quem gosta de, para quem gosta do que urubu come, é um bom filme", disse. Em seguida, respondeu se assistiu ao documentário: "Eu vou perder tempo com uma porcaria dessa?". O filme retrata, sob a ótica da diretora Petra Costa, o processo de impeachment de Dilma Rousseff.

Mau tempo adia reinauguração da Estação Comandante Ferraz
A reinauguração da Estação Comandante Ferraz, na Antártida, prevista para ocorrer nesta terça-feira (14), foi adiada. De acordo com a Marinha, as condições meteorológicas na região impediram o deslocamento das autoridades de Punta Arenas, no Chile, para a base. Fazem parte da comitiva o vice-presidente Hamilton Mourão e os ministros Tarcísio de Freitas (Infraestrutura), Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia) e Fernando Azevedo (Defesa). A previsão é de que o evento aconteça amanhã (15), em horário a ser confirmado.



Um pensador para a nossa era.
Um filósofo e não um formado em filosofia

"Não vamos cometer aqui o insulto de chamar Roger Scruton, o filósofo inglês morto neste fim de semana, aos 75 anos, de “importante”.

Esta é uma palavra que se tornou horrivelmente barata nos últimos anos, a ponto de não significar mais nada – serve apenas para elogiar alguém de graça, quando não se consegue achar méritos objetivos na obra do elogiado, ou mesmo quando não há obra nenhuma a elogiar.

Temos, assim, o escritor “importante”, o artista “importante”, o cineasta “importante” e por aí afora; como não dá para dizer que fizeram alguma coisa de excelência comprovada, ou se fizeram realmente alguma coisa, confere-se a todos eles o título de “importante” e todo mundo fica feliz.

Scruton foi, isso sim, um extraordinário pensador dos tempos em que vivemos – um filósofo de verdade, e não um cidadão que se formou em filosofia, ou dá aulas na universidade, ou escreve sobre o assunto, sem a obrigação de ter, nunca, alguma ideia própria.

Ao longo dos últimos 50 anos, e nas páginas de 50 livros, Roger Scruton deixou uma imensa produção de pensamentos essenciais para a visão conservadora da vida e do mundo na era contemporânea – um filósofo da grande linhagem de Edmund Burke e os outros gigantes ingleses que lançaram os alicerces das ideias que regem até hoje as sociedades livres.

“Pessoas de esquerda acham muito difícil conviver com pessoas de direita, porque acreditam que elas sejam o mal”, escreveu ele numa das sínteses mais devastadoras que fez das disputas ideológicas de hoje. “Eu, do meu lado, não tenho problema nenhum em me dar bem com elas, porque simplesmente acredito que estão enganadas”.

Scruton dedicou-se com aplicação especial, entre a vasta obra que deixou, às questões da estética, da cultura e da política. A qualidade de uma obra artística, para ele, podia, sim, ser estabelecida por critérios objetivos – a beleza é a base dessa avaliação, e beleza não é um conceito abstrato, e sim uma realidade materialmente visível.

“Estilos vão e vêm”, escreveu Roger Scruton, “mas as exigências do julgamento estético são permanentes”. Ele jamais teve medo de dizer que a “equalização” da cultura, tão venerada entre a esquerda como arma para combater o “elitismo”, é um disparate.

Não faz nenhum sentido, em sua visão, alegar que a alta cultura, ou a “cultura clássica”, é uma espécie de “propriedade da elite” e só beneficia os que têm acesso a ela; seria o mesmo que sustentar que a matemática não adianta nada para quem não a entende em seus níveis mais avançados. “O processo de transmissão cultural não poderá sobreviver se os professores forem obrigados a ensinar Mozart e Lady Gaga ao mesmo tempo, em nome de uma agenda de igualitarismo”, resumiu Scruton.

É dele, também, uma das mais precisas explicações sobre porque os intelectuais, em sua grande maioria, são de esquerda. “Eles são atraídos naturalmente pela ideia de uma sociedade planejada porque acreditam que o planejamento ficará a seu cargo”. O que atrai os intelectuais no marxismo, diz Scruton, não é a verdade, mas o poder que ganhariam se o mundo fosse controlado pelo Estado – e, em consequência, por eles. “A notável capacidade de sobrevivência do marxismo”, conclui, “está no fato de que é um sistema de pensamento dirigido para a obtenção do poder.”

O que Roger Scruton ainda poderia produzir, nos próximos anos, vai nos fazer uma imensa falta.

J. R. Guzzo