sábado, 8 de agosto de 2020

 

O Mago de Oz

Por Alexandre Garcia

Com quase 100 mil vidas ceifadas, milhões de empregos estraçalhados, milhares de empresas fechadas, dois dos três poderes têm como prioridade fake news. Como se a desgraça imposta por esse estranho e atípico vírus fosse resolvida quando o Brasil se tornasse blindado contra notícias falsas - a menos que haja contra as redes sociais uma convergência de interesses comerciais com interesses políticos.

Nos meus anos de vida, a primeira fake news de que lembro foi em janeiro de 1952 - eu tinha 11 anos -, em O Cruzeiro, a revista de maior circulação na época. O fotógrafo Ed Keffel fez fotos numa montagem e a revista publicou como discos voadores na Barra da Tijuca. E vendeu muito por isso. Desde então, não cesso de ver fake news em lugar de fatos. O estranho é que só agora o Supremo, a Câmara e o Senado passaram a se preocupar com isso.

César Maia, pai do presidente da Câmara, denunciou algo mais pérfido que uma notícia falsa: o factoide. Parece fato, tem aparência de fato, é embrulhado como fato, mas serve para "embrulhar” o leitor, o ouvinte, o telespectador. O Wall St. Journal acaba de ter uma espécie de rebelião na redação, exigindo que notícia e opinião venham separados, não misturados.

Fofocas e mexericos costumam vir disfarçados de notícia. No entanto, a preocupação do Congresso e do Supremo só visa as redes sociais, exatamente o instrumento pelo qual todos ganharam voz, para reivindicar, desabafar, sugerir, opinar, criticar. Como se trata de gente, não de anjos, também há ódios, mentiras, maus conselhos, ofensas. Para esses, a própria comunidade digital tem os anticorpos: a capacidade de pesquisar e derrubar a mentira, de responder, de boicotar, de expor o ofensor.

E as leis da democracia também têm os remédios, o Código Penal e até a Lei de Segurança Nacional. O que querem inventar então? A quem interessa calar opinião, restringir a liberdade de expressão, a censura prévia, o direito de defesa, suspeitos de crime não previsto na legislação? Fica no ar o mau cheiro da fumaça de totalitarismo. Uma caça às bruxas, mais parecendo com um macartismo de sinal invertido

Que personagens da ficção esses agentes da censura estariam personificando? O Big Brother, o Irmão mais Velho, de George Orwell, que policiava até pensamento? Ou apenas o Mago de Oz, que, atrás do biombo que o protegia, ameaçava com fogo e trovões, mas acabou desmascarado como charlatão pela menina Dorothy?


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