Os cuidados
necessários com a CPI da Lava Toga
Enquanto o
presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem em suas mãos a decisão sobre a
CPI da Lava Jato, que nada mais é que vingança da esquerda e de políticos
investigados contra o ministro Sergio Moro e a força-tarefa do Ministério
Público, no Senado a controvérsia gira em torno de outra CPI, a chamada “Lava
Toga”.
Esta é a terceira vez que o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE)
tenta emplacar a comissão, aproveitando a crescente indignação popular e de
setores do parlamento contra o Poder Judiciário, especialmente o Supremo
Tribunal Federal. No entanto, a iniciativa enfrenta resistências do presidente
da casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da uma improvável aliança entre o PT e o
senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro.
De fato, o
Supremo tem dado muitos motivos para críticas. Há casos em que ministros
participam de votações ou concedem decisões monocráticas mesmo quando há
circunstância evidente de suspeição. A corte também tem abusado do ativismo
judicial, criando legislação e usurpando atribuições do Poder Legislativo. E,
em outras situações, decide de forma equivocada, apegada a formalismos, como na
recente anulação de uma condenação no âmbito da Operação Lava Jato. No entanto,
não bastam decisões controversas ou que geram revolta na sociedade para embasar
um pedido de CPI. Para haver a investigação, é preciso que haja não apenas um
fato concreto, mas também que se trate de irregularidade.
Os membros
do Judiciário – e isso inclui, por óbvio, os ministros do STF – não constituem
um superpoder imune a críticas ou ao sistema de freios e contrapesos
Vieira
baseou seu requerimento no Inquérito 4.781, aberto em março pelo presidente do
Supremo, Dias Toffoli, para investigar supostas fake news contra membros da
corte. Este inquérito, em que inacreditavelmente o Supremo se colocou no
quádruplo papel de vítima, investigador, acusador e julgador, atropela o devido
processo legal; além disso, já rendeu um vergonhoso episódio de censura contra
a revista Crusoé e foi instaurado sem um fato específico que o motivasse –
portanto, sem suspeito determinado, o que colocaria em xeque até mesmo o papel
do STF como foro adequado. As irregularidades são tantas que a
Procuradoria-Geral da República pediu a suspensão do inquérito, o que foi negado
pelo relator, ministro Alexandre de Moraes; uma ação da Rede Sustentabilidade
que também solicita o fim do inquérito ainda aguarda julgamento pelo plenário.
Este, sim, é
motivo pelo qual caberia a abertura de uma CPI, amparada por uma das
prerrogativas do Senado, a de fiscalizar o STF. O grande risco é o de, ao
“investigar condutas ímprobas, desvios operacionais e violações éticas por
parte de membro do Supremo Tribunal Federal”, como afirma o requerimento da CPI
ao descrever seu objetivo, os membros acabarem extrapolando suas funções,
incluindo na comissão atitudes que, embora controversas ou equivocadas, não
constituem irregularidade. Estaríamos, aqui, diante do mesmo “crime de
hermenêutica” tão criticado durante a tramitação do projeto de lei de abuso de
autoridade: os senadores estariam investigando ministros do Supremo apenas por
discordar de certas decisões, e não porque há suspeita de irregularidade, crime
de responsabilidade ou violação da Constituição. Se instalada, a CPI da Lava
Toga e seus membros precisarão de um cuidado especial para que os trabalhos não
saiam dos trilhos e transformem a comissão em mero instrumento de ataque aos
ministros do STF.
Atendo-se
estritamente aos limites de investigação propostos no requerimento, a CPI da
Lava Toga não teria nada de inconstitucional, ao contrário do que insinuou o
ministro Gilmar Mendes, para quem, “se essa CPI fosse instalada (...),
certamente o próprio Supremo mandaria trancá-la”. Os membros do Judiciário – e
isso inclui, por óbvio, os ministros do STF – não constituem um superpoder
imune a críticas ou ao sistema de freios e contrapesos. Quando erram, devem
estar sujeitos aos mesmos procedimentos aplicados aos membros dos demais
poderes e ao cidadão comum, e o Senado é foro legítimo para promover a
investigação quando se trata dos ministros do STF.
Gazeta do
Povo
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