Médium reaparece e diz que
é inocente
Foram dez minutos de
tumulto e gritaria. Assim que desembarcou num Ford Ka branco, João de Deus foi
cercado por seus funcionários, fez uma visita de menos de 10 minutos na
sala de atendimento e retornou. Jornalistas acompanharam o trajeto, mas foram
impedidos de se aproximar do médium, que fez a primeira visita ao centro Dom
Inácio de Loyola depois de ser acusado de abuso sexual por mulheres que buscaram a casa em busca de
tratamento espiritual.
No trajeto, funcionários
gritavam: "Respeitem! Ele vai falar." A promessa, no entanto,
não se concretizou. Apesar do amplo espaço, não foi providenciado um
local para a entrevista. Em um rápido pronunciamento que fez aos fiéis, no
altar do centro, o médium afirmou que quer cumprir a lei brasileira.
"Eu estou na mão da lei brasileira. O João de Deus ainda está vivo".
Um vídeo gravado por funcionários sobre a fala foi distribuído para
jornalistas.
Ele saiu sem dar
entrevista, apenas disse, entre um grito e outro de seus funcionários, no
caminho de volta ao carro, que cumpria uma missão dada há 60 anos. E repetiu
várias vezes: "Eu sou inocente".
Na confusão, voluntários
chegaram a agredir jornalistas. A chegada no centro ocorreu por volta das
9h20, um horário pouco usual. João de Deus, cujo nome de batismo é João de
Faria, horas antes havia desembarcado no aeroporto de Anápolis, de um voo
procedente de São Paulo.
Esta foi a primeira
aparição pública do médium, depois que mulheres vieram a público acusá-lo de
abuso sexual. Passados cinco dias após as primeiras denúncias, mais de duas
centenas de mulheres procuraram o Ministério Público para
fazer relatos semelhantes. Pelo menos quatro inquéritos já foram abertos.
As denúncias afetaram o
movimento da casa, onde atendimentos são realizados. Por volta das 8h30, cerca
de 400 pessoas - incluindo crianças e duas pessoas de cadeiras de rodas -
aguardam a chegada do líder espiritual. Isso representa um terço do
movimento habitual. Chico Lobo, um dos funcionários da casa, afirmou que
três ônibus - de São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas - chegaram à cidade.
"É menos que o de costume. Mas há também o impacto da proximidade das festas.
Nesta época, tradicionalmente o movimento cai."
Funcionários e voluntários
da casa começaram a chegar na casa Dom Inácio de Loyola mais cedo.
"Sabíamos que seríamos necessários aqui. Ele sempre esteve presente com
seu amor, agora estamos prontos para defendê-lo", disse Jacilda Oliveira
Soares, que desde 1985 frequenta a casa. Há alguns anos, ela se dedica a
organizar as filas de atendimento.
Primeiro, em geral,
ingressam fiéis escolhidos pelo médium para formar a corrente de oração.
Eles ocupam uma sala próxima onde o líder costuma atender e ficam
concentrados durante todo atendimento. Para enfrentar as longas horas,
muitos trazem travesseiros ou uma almofada especial, dobrável, para
proteger as costas e o quadril. Nesta quarta eram cerca de 200 nessa
condição.
Outras 200, a maioria
usando roupas brancas, foram sentadas em cadeiras situadas num pátio coberto,
aguardando atendimento. As pessoas são chamadas em grupos, de acordo com a
frequência que vem à casa. De acordo com funcionários, mesmo sem a presença
de João de Deus, os trabalhos podem ser realizados. "Onde ele
estiver, a energia dele estará aqui", dizia Jacilda.
Um dos fies, o professor
José Raimundo, de 63 anos, saiu de Manaus em busca de atendimento. Ele
disse que ficou sabendo das denúncias por meio da imprensa, mas que isso não
abalou sua fé. “João já me curou de problemas na visão e de palpitações. Venho
aqui há 40 anos. Se ele errou, tem que ser investigado. Mas isso não tira o
poder da sua cura”, afirma.
Outra fiel, a assistente
social Mara Ortiz também viajou a Abadiânia já sabendo das acusações. Ela saiu
de Pelotas, no Rio Grande do Sul, na terça-feira, 11, em uma caravana. De
acordo com ela, estavam confirmadas 28 pessoas no grupo gaúcho, pelo menos 18
desistiram de viajar após verem a repercussão do caso. “Ele não é um Deus. É
humano”, diz Mara que ainda revelou ser a primeira vez em que pretende se
encontrar com João de Deus.
Fato negativo
O prefeito de Abadiânia,
José Diniz, divulgou uma nota na tarde de terça, em que diz ver as acusações
contra o médium João de Deus como um fato negativo para o município. Segundo
ele, a cidade "recebe semanalmente milhares de turistas que procuram a
cura para as suas enfermidades e anseios, assim colaborando com o
desenvolvimento da cidade". Ainda em nota, o prefeito diz que, às
denúncias contra o médium João de Deus, devem ser investigadas e apuradas pelos
órgãos competentes.
Agência Estado