Na terça-feira, a
Comissão Especial da Reforma Tributária na Câmara dos Deputados aprovou o
relatório de Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), abrindo o caminho para as mudanças
serem votadas nos plenários das duas casas do Congresso. A grande mudança
prevista é a substituição de dez impostos e contribuições cobrados atualmente –
IPI, IOF, CSLL, PIS, Pasep, Cofins, Salário Educação, Cide Combustíveis, ICMS e
ISS – por apenas dois novos tributos, um Imposto sobre Operações com Bens e
Serviços (IBS), estadual, e um Imposto Seletivo (IS), federal, que incidiria
sobre certos bens e serviços específicos.
No entanto, toda a
discussão sobre a reforma ficará, inevitavelmente, para o ano que vem, por
dois motivos principais. Como se trata de uma emenda à Constituição, é preciso
esperar que terminem as intervenções federais no Rio de Janeiro e em Roraima,
já que nenhuma PEC pode ser promulgada enquanto houver intervenções em vigor.
Além disso, a reforma nos moldes propostos por Hauly não é consensual dentro da
equipe econômica de Jair Bolsonaro, comandada por Paulo Guedes. O grupo inclui,
por exemplo, tanto defensores de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) quanto
proponentes de um imposto único sobre operações financeiras.
De imediato, o
grande mérito da proposta aprovada pela comissão especial está na simplificação
tributária. O Brasil, hoje, é líder absoluto em tempo gasto pelas empresas para
cumprir suas obrigações tributárias: cerca de 2 mil horas por ano, mais que o
dobro do segundo colocado no levantamento do Banco Mundial. Boa parte desse
tempo e esforço poderia ser gasta em outras atividades, direcionadas ao aumento
da produtividade ou da inovação, por exemplo. Mas a reforma ainda deixa uma
série de dúvidas e algumas certezas de que certos problemas possivelmente
seguirão inalterados.
Por mais que a intenção do
relator seja a de inverter a lógica tributária atual, em que a maior parte da arrecadação
vem de impostos sobre a produção e o consumo, prejudicando especialmente os
mais pobres, a simples substituição de tributos prevista na reforma não é
garantia de que esse objetivo seja atingido. Tudo dependerá das alíquotas que
serão cobradas tanto nos novos impostos quanto naqueles que continuarão a
existir, como o Imposto de Renda, IPVA, IPTU, impostos sobre importação e
exportação, e contribuição previdenciária sobre folha de pagamento. As
alíquotas, no entanto, não são objeto da PEC. Conseguir a justiça tributária –
que aqueles que têm mais sejam de fato os que pagam mais impostos – será uma
outra batalha, que virá depois da aprovação de uma reforma, seja a que está na
mesa hoje, seja uma outra proposta feita mais adiante.
Também não se vislumbra
mudança nem na carga tributária total, nem na distribuição dos recursos entre
União, estados e municípios. A desproporção absurda entre as responsabilidades
atribuídas aos entes supranacionais e a fatia que eles recebem do bolo
tributário ajuda a agravar as crises fiscais que estados e municípios vivem
atualmente. A reforma até diminui os riscos da continuação da guerra fiscal que
afeta a arrecadação de várias unidades da Federação, mas sem uma redistribuição
substancial desse dinheiro os estados e municípios continuarão a mendigar por
recursos, especialmente no caso daquelas cidades inviáveis que, hoje, dependem
de fundos de participação para se sustentar – quando são capazes disto.
Mesmo que não seja a
reforma definitiva, que resolverá de vez os problemas tributários da nação, o
substitutivo aprovado na comissão especial, pelos méritos que tem, merece pelo
menos análise cuidadosa da equipe econômica. Qualquer proposta alternativa
formulada pelo novo governo terá de mostrar ser um avanço em relação ao que já
está na mesa para votação e foi fruto de um exaustivo trabalho no Legislativo.
Do contrário, corremos o risco de cair em um velho problema brasileiro: o de
ter plena consciência do que precisa ser feito, mas nunca ter a disposição para
fazê-lo.
Gazeta do Povo
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