Tanto o presidente eleito
Jair Bolsonaro como o candidato derrotado Fernando Haddad, tão logo o resultado
da eleição presidencial foi conhecido, trataram de acalmar os ânimos da
sociedade, bastante exaltados ao longo da campanha eleitoral, especialmente na
reta final. Dado o nível da disputa, muito abaixo do que seria considerado
civilizado, não surpreende que os dois contendores tenham sido incapazes de
respeitar a etiqueta prevista para a ocasião - isto é, nem o candidato
derrotado telefonou para o vencedor nem o vencedor mencionou o nome do
derrotado ao fazer seu discurso da vitória. No entanto, Bolsonaro e Haddad, em
seus discursos, reduziram em vários graus o tom belicoso da campanha eleitoral
e conclamaram respeito às regras do jogo e prevalência do interesse nacional.
É evidente que há uma
distância muito grande entre o discurso e a prática, mas, no momento, esses
pronunciamentos servem de baliza para o comportamento da militância de parte a
parte e também para enquadrar as expectativas do País, ajudando a desanuviar um
pouco o clima de apocalipse que se instaurou há algumas semanas.
Bolsonaro fez dois
discursos. O primeiro foi de improviso, feito para as redes sociais, ambiente
no qual o eleito fez praticamente toda a sua campanha. Ali, pareceu dirigir-se
a seus aguerridos simpatizantes, ao criticar a “grande mídia” e ao dizer que o
País não podia mais “continuar flertando com o socialismo, com o comunismo e
com o populismo” - numa referência ao PT, seu alvo predileto durante a
campanha. Nem parecia que a campanha havia se encerrado.
Felizmente, o presidente
eleito fez logo em seguida outro pronunciamento, este sim, dirigido ao conjunto
da sociedade - quando então manifestou seu compromisso de ser “um defensor da
Constituição, da democracia e da liberdade”.
A palavra “liberdade”,
aliás, foi uma das mais repetidas por Bolsonaro: “O que ocorreu hoje nas urnas
não foi a vitória de um partido, mas a celebração de um país pela liberdade.
(...) Liberdade é um princípio fundamental. Liberdade de ir e vir, andar nas
ruas em todos os lugares deste país. Liberdade de empreender. Liberdade
política e religiosa. Liberdade de informar e ter opinião. Liberdade de fazer
escolhas e ser respeitado por elas”.
A ênfase nas liberdades e
no respeito ao Estado Democrático de Direito pareceu ser uma resposta à
frequente acusação de que Bolsonaro flerta com soluções autoritárias - afinal,
em sua carreira política, fez elogios à ditadura e a torturadores. Assim, é
importante que Bolsonaro tenha se sentido na obrigação de reafirmar seu
respeito à Constituição e aos primados da democracia, pois nada, nem agora nem
no futuro, pode justificar a violação desses princípios.
O mesmo se pode dizer da
oposição que o PT pretende liderar. O discurso de Fernando Haddad ao admitir a
derrota fez constar as referências de praxe à prisão do chefão Lula da Silva e
ao impeachment de Dilma Rousseff, por ele considerados atos de exceção, mas em
seguida dirigiu-se a “todo o povo brasileiro”, ao dizer que “nós temos a
responsabilidade de fazer uma oposição colocando os interesses nacionais (...)
acima de tudo”. E Haddad acrescentou: “Vamos defender os nossos pontos de
vista, respeitando a democracia, respeitando as instituições, mas sem deixar de
colocar o nosso ponto de vista”.
É alvissareiro, vindo de um
petista, que haja declarada disposição de fazer oposição pensando no interesse
do País, e não, como é costume no partido de Lula da Silva, pensando nas
estratégias eleitoreiras do demiurgo de Garanhuns. Quando diz que “daqui a
quatro anos nós teremos uma nova eleição”, Haddad sinaliza à militância que
deve respeitar o mandato conferido a Bolsonaro, coisa incomum em se tratando do
PT, campeão de pedidos de impeachment quando esteve na oposição. Resta saber
qual será a representatividade de Haddad no PT, pois, até onde se sabe, o
partido continuará a ser dirigido de uma cela em Curitiba.
Vencido e vencedor parecem
ter compreendido que o discurso de ódio, uma vez apurada a vontade soberana da
Nação, levaria a uma perigosa ruptura. Atenderam, portanto, ao chamado da
razão, também para não serem estigmatizados por uma Nação que só deseja
concórdia e prosperidade.
Portal Estadão
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