Há que se relativizar a
ideia amplamente propagada de que foi o processo eleitoral que dividiu a Nação
segundo os dois extremos do espectro político-ideológico. Primeiro, porque não
é verdade. Além disso, a divisão política que ocorre com a sociedade no
processo eleitoral não é um mal por si só. Ao contrário, é esperada no curso de
uma campanha eleitoral democrática. Uma eleição contrapõe visões distintas
sobre os rumos de um país e é de sua natureza opor opiniões e crenças
diferentes, mas num dissídio que cessa assim que são apurados os votos – e não
quando os “inimigos” são dizimados, como na guerra.
A julgar pelos resultados
das pesquisas de intenção de voto, observa-se que, de fato, diante dos nomes
sob escrutínio, os candidatos que compõem o chamado centro político – não o
“centrão”, mas uma zona onde o compromisso é a saída natural dos dissídios –
têm sido preteridos por candidatos que representam valores e ideias que, até
recentemente, eram pouco aceitos pela maioria dos eleitores. Viceja o discurso
sectário, a negação do diálogo para a construção de um compromisso nacional em
torno das medidas a serem adotadas para tirar o Brasil da atual crise política,
econômica e moral.
A polarização é própria da
política eleitoral. Porém, passada a eleição, deve prevalecer um espírito de
boa vontade entre todos os cidadãos, governantes e governados, para que as
dissensões não deem início a outra crise, esta de consequências imprevisíveis.
E o primeiro a estar imbuído por este espírito de compromisso há de ser o
vencedor nas urnas.
No dia 28 de outubro, o
País conhecerá o futuro presidente da República. É improvável que o eleito,
seja quem for, conte com a simpatia ou a boa vontade da imensa maioria da
população. Mas na manhã de segunda-feira, dia 29, milhões de brasileiros irão
acordar para mais um dia de trabalho duro. Um deles terá a árdua missão de
preparar o governo de um país em crise e carente não apenas de um discurso, mas
de gestos de união.
A exemplo das instituições
que lhe servem, a sociedade também deverá estar preparada para aceitar o
resultado das urnas, seja qual for. Não será com o aprofundamento das fissuras
que hoje desviam as atenções de expressivos segmentos da população do que
realmente importa – as soluções para os graves problemas nacionais, e não a
campanha de eliminação dos “inimigos” na lide política – que o País haverá de
reencontrar o caminho para um futuro de paz, tranquilidade política e
estabilidade econômica há muito almejado.
Já é conhecido o trabalho
que deve ser feito tanto pelo próximo governo como pelo Congresso Nacional para
que, nos próximos anos, o País possa sanear as contas públicas, atrair novos
investimentos e, assim, voltar a crescer.
Sugestões não faltam e são
de conhecimento público, lastreadas por uma série de estudos assinados por
especialistas genuinamente preocupados com o progresso do País. O próximo
governo não poderá se afastar da agenda de reformas estruturantes cuja execução
é condição sine qua non para a manutenção da solvência do Estado e,
consequentemente, da capacidade de investir em áreas essenciais como saúde e
educação.
Faz parte da agenda básica
a reforma da Previdência, sem a qual o shutdown do Estado não será mais uma
mera ameaça, mas uma realidade de tristes consequências. Louve-se aqui a
disposição do presidente Michel Temer de, ao alto preço de desgastar ainda mais
sua imagem, oferecer ajuda a seu sucessor para encaminhar a aprovação da
reforma ainda este ano, aliviando a pressão, que já não será pequena, sobre o
novo presidente a partir de janeiro de 2019.
Há um país a ser
governado. Há problemas concretos que demandam rápidas ações para que seus
efeitos nocivos sobre a sociedade sejam interrompidos. Uma massa de 13 milhões
de brasileiros desempregados espera poder voltar a trabalhar vença quem vencer.
A despeito das preferências políticas de cada um, o momento é de assunção de um
compromisso nacional em torno de uma agenda de medidas essenciais, sem as quais
qualquer debate político não será mais do que gritos de torcedores.
Portal Estadão
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