Eliane Cantanhêde
O “Partido dos Caminhoneiros” conseguiu o que MST, MTST,
CUT e partidos de oposição ao governo Temer ameaçaram
e não tiveram força para fazer, nem mesmo com a prisão de Lula:
paralisar o País. É uma nova força política que pode ser qualquer coisa, menos
um movimento de esquerda.
Assim como em junho de 2013, o protesto dos caminhoneiros
também teve combustão espontânea, sem partidos por trás ou líderes carismáticos
e estridentes. Ambos surgiram de repente, pegando todo mundo de surpresa e
jogando o governo contra a parede.
A motivação dos milhares de pessoas que foram às ruas em
junho de 2013 foi o aumento das tarifas de transportes urbanos. A dos
caminhoneiros neste maio de 2018 é o aumento diário dos combustíveis,
principalmente do diesel. Os dois protestos encontraram ambiente propício,
foram uma fagulha em palha seca e incendiaram os governos de Dilma, primeiro, e
de Temer agora. O Brasil nunca mais foi o mesmo depois daquele junho. E muita
coisa pode mudar a partir deste maio.
Em 2013, homens e mulheres, jovens e velhos, gente de esquerda
e de direita lotaram as ruas, e o que menos contou foram partidos e ideologias.
Em 2018, há um acordo tácito entre os patrões e caminhoneiros, que fecharam
estradas, produziram um efeito cascata e ameaçam com o colapso.
Litros de leite jogados fora, montanhas de hortaliças
murchas, prateleiras vazias nas farmácias, tanques secos nos postos de
gasolina, falta de água mineral e de combustível de aviação nos aeroportos... E
os preços disparando. O que começou como um protesto de um setor, de uma
categoria, virou um movimento nacional.
Produtores rurais, empresas privadas e serviços públicos
foram atingidos em cheio. E o que dizer do cidadão e da cidadã, já irados com a
corrupção, desconfiados com as eleições, mal-humorados com o governo e
estarrecidos com o aumento da gasolina? A crise, latente, explodiu de cima a
baixo.
Como só iria acontecer, o governo Temer, já tão fraco e a
caminho do fim, virou o principal alvo de várias frentes autônomas e
conflitantes: caminhoneiros, confederações (como a dos Transportes e da
Agricultura), Congresso, a própria Petrobrás e a mais poderosa de todas, a
opinião pública.
O estopim da crise foi o aumento do preço internacional
do petróleo, a disparada do dólar e o trauma da Petrobrás, que afundou com Lula
e Dilma não só pela corrupção, mas também pela manipulação política (ou
populista) dos preços. Só que faltou cuidado.
Assim como aumento de impostos, o de combustíveis é coisa
para governos fortes, o que, definitivamente, não é o caso. Para piorar, a
Petrobrás não apenas impôs o aumento, como impôs um aumento diário! Pode até
fazer sentido empresarial, mas foi de uma audácia política incrível. E na hora
errada.
Temer ficou entre os protestos e a política de preços
independente da Petrobrás. Parente ficou entre uma solução política e uma
sinalização perigosa para o mercado e para os investidores da companhia, que
ontem caiu 14% na Bolsa. E o fim do mundo é (ou seria) ele ir embora.
Em ano eleitoral, o Congresso, à frente Rodrigo Maia e
Eunício Oliveira, aproveitou para tirar uma casquinha na crise e espicaçar
ainda mais o Planalto. E os governadores? Tiraram o corpo fora.
O maior problema no fim deste governo (e no início do
próximo) é a crise fiscal, o rombo das contas públicas. Como cortar impostos do
diesel sem cobrir o buraco com alguma outra receita? Tira de um lado, tem de
pôr do outro. E isso não é uma “maldade liberal”, é um dado aritmético e uma
realidade social: quando 2 + 2 não somam 4 na contabilidade pública, quem
quebra a cara é quem mais precisa do Estado brasileiro.
Publicado no portal do Jornal Estado de São Paulo em
25/05/2018
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