Sem desculpa para atrasos*
O relator da reforma da Previdência não precisa fazer
qualquer tipo de conjectura sobre uma possível nova denúncia
contra Michel
Temer
Na terça-feira passada, o relator da reforma da
Previdência, deputado Arthur Maia (PPS-BA), afirmou que a possibilidade de a
Procuradoria-Geral da República apresentar uma nova denúncia contra o
presidente Michel Temer deverá retardar a tramitação no Congresso da Proposta
de Emenda Constitucional (PEC) 287/2016, que altera as regras previdenciárias.
“Não dá para avançar com uma reforma previdenciária enquanto você tiver uma
pauta do tipo ‘vamos ou não acatar denúncia’ cujo resultado importa em
permanência ou não do presidente da República”, disse Arthur Maia
ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado.
É compreensível – mas injustificável – que a oposição
tente usar uma possível denúncia contra Michel Temer para atrasar o andamento
da reforma da Previdência. Sem maiores responsabilidades por devolver ao País
as condições de desenvolvimento econômico e social, não seria estranho ver os
partidos da oposição enraivecida empenhados numa tentativa desse tipo. Não faz,
no entanto, o menor sentido que o relator da reforma adote semelhante postura.
Em primeiro lugar, vale lembrar que ainda inexiste uma
segunda denúncia contra o presidente Michel Temer. Nova acusação formal é por
ora tão somente uma possibilidade, que, se for efetivada, merece análise isenta
e cuidadosa de seu conteúdo. Basta ver que, apesar de todo o alarde criado em
torno da delação de Joesley Batista, a denúncia contra Michel Temer apresentada
em junho pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, era manifestamente
inepta.
De toda forma, a questão principal não é essa. O relator
da reforma da Previdência não precisa fazer qualquer tipo de conjectura sobre
uma possível nova denúncia contra Michel Temer para dar-se conta de que são
assuntos distintos e que o Congresso pode e deve dar célere andamento à PEC
287/2016.
A proposta de reforma da Previdência é de autoria do
governo, mas sua importância transcende em muito os interesses do Palácio do
Planalto. Se o Congresso não votar a reforma da Previdência, o principal
derrotado não será Michel Temer. É o interesse do País que está em jogo e não
cabe condicioná-lo aos desejos de um procurador-geral em fim de mandato. Sem a
reforma da Previdência, o País estará desprovido de um sistema previdenciário
minimamente compatível com sua realidade fiscal e social, vendo-se obrigado a
continuar bancando com seus parcos recursos públicos um sistema caro e
obsoleto.
Além disso, o déficit da Previdência traz sérias dúvidas
sobre a capacidade de o Estado brasileiro continuar pagando essa fatura. Em
2016, o rombo causado pela Previdência nas contas da União, dos Estados e dos
municípios foi de R$ 305,4 bilhões. Longe de ser temporário, o desequilíbrio é
estrutural e tende a crescer em razão do envelhecimento da população.
Diante do caráter prioritário da reforma da Previdência,
é também um equívoco condicionar o seu andamento a outras reformas, como deu a
entender o deputado Arthur Maia. “Tem que aguardar passar essa fase, que tem
também a reforma eleitoral, para ver se é possível ou não é possível retomar a
Previdência”, afirmou o relator da reforma da Previdência.
Não cabe aguardar para saber se será possível ou não dar
andamento à PEC 287/2016. A reforma da Previdência é um tema difícil, que será
superado tão logo os parlamentares, sem qualquer vacilação, decidam não esperar
pelo melhor dos momentos e, antes, construam eles mesmos as condições para sua
aprovação. E cabe ao relator da reforma a liderança nessa empreitada.
A responsabilidade do Congresso com a reforma da
Previdência é também a consciência de que não basta aprovar algumas alterações
superficiais ou medidas de curto alcance, que funcionariam mais como bombas de
efeito retardado do que como uma real correção de um problema que há muito
tempo compromete o equilíbrio fiscal do Estado e, consequentemente, as futuras
gerações de brasileiros. Faz-se necessária uma reforma de verdade, sem
paliativos e sem atrasos.
*Publicado no Portal Estadão em 31/08/2017
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