Doa a quem doer*
PT e PMDB veem a denúncia de Temer e a condenação
de Lula
com sinais trocados. E a verdade?
Eliane Cantanhêde
Condenado pelo juiz Sérgio Moro por receber R$ 2,25 milhões de propinas da
empreiteira OAS, o ex-presidente Lula mobilizou um punhado de defensores e
outro de opositores na Avenida Paulista, em São Paulo. E, ontem, reuniu
jornalistas, petistas e aliados incondicionais para dizer que a condenação visa
a “fechar o golpe” iniciado com o impeachment de Dilma. E advertiu: “Estou no
jogo”.
Gravado pelo empresário Joesley Batista pedindo R$ 2 milhões “para pagar advogados”,
o senador Aécio Neves constrange os correligionários em reuniões, não quer
largar o osso da presidência do partido e ajuda a aprofundar uma velha praga
tucana: a divisão interna. Pelas pesquisas, está completamente fora do “jogo”
de 2018.
Denunciado pela PGR como beneficiário dos R$ 500 mil da JBS para o ex-assessor
Rocha Loures, o presidente Temer luta bravamente pelo mandato na Câmara, que já
presidiu três vezes, e recorre a artigos em jornais e falas pelas redes sociais
para se defender. Mal se aguenta no jogo agora, quanto mais em 2018.
A diferença política entre Lula, Aécio e Temer é que o
petista tem tropa. Uma tropa disposta a fechar olhos, ouvidos, bocas e
racionalidade para qualquer denúncia e condenação que possam macular a imagem
do seu grande líder. Aécio está aquartelado no PSDB, e Temer, no Congresso. Nas
ruas, têm zero.
Petistas do Congresso e das manifestações têm duas
certezas: a sentença de Moro é “vazia”, “sem provas”, uma “perseguição política
contra a candidatura Lula em 2018”. Já a denúncia contra Temer é “perfeita”,
“cheia de provas” e não deixa dúvidas de que “o dinheiro de Loures era para o
presidente”.
Dois pesos, duas medidas, mas não é exclusividade
petista. PMDB, PP, PTB e outros partidos da base aliada se esgoelam na CCJ da
Câmara para considerar a denúncia do procurador Janot contra Temer “inepta”,
“meras suposições”, “um golpe” contra Temer. Já a condenação de Lula é
“perfeita”, “cheia de provas”, não deixando dúvidas de que “o triplex era de
Lula”.
E o PSDB? Apesar de o tucano Paulo Abi-Ackel (MG) ter
feito o parecer alternativo pró-Temer na CCJ, cinco dos sete tucanos na CCJ votaram
a favor da denúncia de Janot e, portanto, contra Temer. E, fora da comissão,
usam o mesmo tom para a condenação de Lula. Ou seja, o partido quer “Fora,
Temer” e “Fora, Lula”.
Há dois problemas. Um é que eles gritam “fora” para os
outros, mas não têm quem pôr “dentro” e a ascensão de João Doria é prenúncio de
racha. O outro problema é o que acontecerá quando Aécio estiver na atual
situação de Lula e Temer. Provavelmente, o PSDB vai se dividir, ora, ora, parte
defendendo e parte abandonando Aécio.
Vê-se, portanto, que PT, PSDB, PMDB e Centrão não estão
analisando as 218 páginas de Moro contra Lula, as 64 de Janot contra Temer ou
as gravações contra Aécio. Cada um lê, vê e entende de acordo com suas crenças
e/ou interesses. A verdade é só detalhe... Mas a inclusão de Temer e de Aécio
no redemoinho esvazia a versão do PT de “perseguição contra Lula” – antes, por
ele ser “um operário nordestino e pobre” (que, aliás, ele não é mais há
décadas); agora, para impedir que volte à Presidência em 2018.
A sociedade quer o avanço da Lava Jato, doa a quem doer.
Quer saber se documentos, fotos e depoimentos contra Lula são consistentes, em
que crime se enquadra o pedido de dinheiro de Aécio para Joesley e se Loures
pegou a mala para Temer ou para ele. Ontem, Lula arrancou demonstrações de
apoio e a CCJ deu duas vitórias a Temer, mas isso só mostra uma coisa: a
Justiça anda para um lado, a política se vira para o outro. E a sociedade bem
sabe com quem está.
*Publicado no Portal Estadão em 14/07/2017
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