Temer pintado para a guerra*
Eliane Cantanhêde
Sempre tão frio, contido, formal, o presidente Michel
Temer foi mercurial na sua declaração pela TV e partiu diretamente para cima do
procurador geral da República, Rodrigo Janot. Classificando a denúncia contra
ele de “ilações”, Temer fez uma comparação: se a mala de dinheiro de Rocha
Loures foi para ele (como acusa a PGR), por que os “milhões” que o ex-braço
direito de Janot, Marcelo Miller, teria ganhado para advogar na delação da JBS
não seriam também de Janot?
É uma estratégia arriscada, mas tem um alvo certo: a
Câmara dos Deputados, que vai ser chamada a autorizar ou não o prosseguimento
do processo contra o presidente no Supremo. A intenção do Planalto, somando aí
ministros, marqueteiro e assessoria jurídica, é criar um confronto entre Janot
e Temer na Câmara, onde o procurador é considerado “algoz dos políticos” e o
presidente viveu grande parte de sua vida pública, inclusive presidindo a Casa
por três vezes.
Incisivo e cercado por políticos da base aliada _ para
demonstrar apoio político e condições de sobrevivência _, Temer centrou sua
fala justamente na tese de que a denúncia não passa de “ilação”, “infâmia
política”, “precedente perigosíssimo”, “trabalho trôpego”, “trama de novela”,
“denúncia de ficção”, “embriaguez da denúncia” e, finalmente, “atentado contra
o País”.
No jargão jornalístico, Temer criou assim várias opções
de “lide”, ou seja, de títulos e manchetes para os jornalistas que se espremiam
no mesmo salão onde Dilma Rousseff também tentou, um dia, salvar o próprio
pescoço. Sem sucesso.
Por fim, o presidente deixou claríssimo que não pretende
renunciar ao mandato, nem vai seguir a sugestão de Fernando Henrique Cardoso,
endossada por Lula, de antecipação das eleições. “Não fugirei das batalhas nem
da guerra que vem pela frente”. O Temer do pronunciamento estava pintado para a
guerra.
*Publicado no Portal Estadão em 27/06/2017
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