Tunga no bolso
alheio*
O Planalto torce, ou reza, para que
a ministra Cármen Lúcia aproveite o seu discurso de posse na presidência do
Supremo Tribunal Federal, segunda-feira, para dar alguma sinalização contrária
ao aumento dos salários dela própria e de seus dez colegas na mais alta corte.
Tida e havida como austera, poderia dizer, por exemplo, que não é hora de
aumentar salários já altos, e pagos por toda a sociedade brasileira, enquanto
12 milhões de desempregados estão na rua da amargura.
E por que contar com Cármen Lúcia? Porque o Planalto acha
que se esperar pelo atual presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski, e pelo
presidente do Senado, Renan Calheiros, está perdido. Ou melhor, estamos perdidos
todos os que sustentamos o setor público, porque o salário dos ministros da
corte é o teto do funcionalismo e tem efeito cascata em todos os três poderes e
em todos os Estados.
Aliás, outros aliados do Planalto na guerra contra essa
nova farra salarial, além de Cármen Lúcia, são os governadores, que têm grande
influência sobre suas bancadas e estão aflitos diante de uma pressão de mais R$
4 milhões ao ano caso o aumento dos ministros do Supremo passe e arraste para
cima os salários dos servidores estaduais.
Os Estados já estão na pindaíba, depois de anos de uma
visão estatizante que inflou dramaticamente a folha de pagamentos. Hoje, Rio e
Rio Grande do Sul, por exemplo, têm multidões de funcionários, mas não têm como
pagá-los. E ainda convivem com categorias querendo mais. Lindo, não é? Alguns
governadores lamentam: “Não governamos de fato, viramos gestores de folhas de
pagamento”.
Bem, Cármen Lúcia e Renan se encontraram ontem, mas juram
que ninguém falou e ninguém ouviu nada sobre salários. A ministra foi apenas
convidar o senador para sua posse e acha que até lá, ou seja, nestes três dias,
quem cuida disso é Lewandowski – que, dizem, anda doido para deixar esse
presentão para todo o funcionalismo, à custa das contas públicas.
Quanto a Renan: ao reservar para o último ato do
impeachment o fatiamento da Constituição para manter os direitos políticos de
Dilma, ele mandou um recado para o PT e para o Planalto do correligionário
Michel Temer: “Eu posso ser um aliado muito útil (como
foi para o PT), ou posso fazer muito mal (como fez ao governo)”.
O novo “mal” que Renan poderia fazer, depois de viajar à
China com Temer, seria permitir ou, pior, estimular o aumento do STF. E era
exatamente o que ele parecia fazer ontem, dizendo que incluiria a urgência do
projeto na pauta e, na sequência, poria em votação o próprio projeto. E ainda
sugeria separar os subsídios dos ministros do STF das demais carreiras para
diminuir o estrago. Só no fim do dia recuou e retirou o texto. Estaria ele se
divertindo com coisa séria? A dívida da União é de R$ 4,3 trilhões, com
desembolso de R$ 500 bilhões neste ano. É preciso cortar, não aumentar gastos.
“Fora Temer” 1. O Planalto comemorou a reunião de três
horas entre cinco ministros e representantes do MST, na segunda-feira, e
decidiu: o “Fora Temer” e o enfrentamento político ficam por conta dos
partidos; o governo se concentra na pauta, quando pauta houver.
“Fora Temer” 2. Na versão palaciana, os protestos
contra o presidente numa arquibancada do 7 de Setembro em Brasília partiram de
120 convidados da USP. O convite à universidade é tradicional, mas o governo
mudou, esqueceu de atualizar a lista de convites e instalou o inimigo ao lado
da tribuna de honra – onde estavam Temer e Marcela.
“Fora Cunha”. De um expoente governista, sobre as
chances de Eduardo Cunha na segunda-feira: “Se tiver quórum, ninguém sai vivo
daquele plenário”. Adeus, querido!
*Publicado no Portal estadão.com em
09/09/2016
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