O agosto de Dilma e Cunha
*Eliane Cantanhêde
É incrível como os arqui-inimigos Dilma Rousseff e
Eduardo Cunha vão caminhando para o ocaso político, lado a lado, semana a
semana, e podem chegar juntos ao cadafalso em agosto, o mês do cachorro louco
na política brasileira, quando Getúlio Vargas se matou, Jânio Quadros
renunciou, Juscelino Kubitschek morreu.
Dilma não foi pessoalmente se defender na Comissão de
Impeachment e enviou uma carta em que fala menos para os senadores, que já têm
seus votos bastante definidos, e mais para sua biografia e para a opinião
pública. Nessa carta, disse que errar é humano, mas, no seu caso, sem
“desonestidade, covardia ou traição”. O impeachment, acusou, é uma “injustiça”
e uma “farsa”.
Quanto a Cunha: ele renunciou à presidência da Câmara
para ganhar ainda mais tempo e principalmente para tentar salvar o mandato, mas
é tarde demais: não vai escapar da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ),
nem do plenário da Câmara e muitíssimo menos da Justiça.
No máximo, ele e seus seguidores vão tentar manobrar com
os prazos. Por exemplo, marcando para o mesmo dia, a próxima terça-feira, a
votação da cassação de Cunha na CCJ e a eleição do novo presidente no plenário
da Câmara. Cria-se, assim, uma relação direta de causa e efeito: elege-se o sucessor
para livrar a cara de Cunha? Mas pode ser em vão.
Ambos, Dilma e Cunha, sabem que estão perdidos. O mundo
político considera pule de dez que o impeachment dela será aprovado em agosto
pela comissão e em seguida pelo plenário do Senado. E trabalha ativamente para
evitar que Cunha, já ferido de morte, tenha fôlego para definir como e quando
será seu próprio enterro.
Há um esforço suprapartidário especialmente para evitar
que possa fazer o sucessor na presidência. Seria como morrer num dia e
reencarnar no outro na pele de um aliado. Faria, assim, uma dupla pressão sobre
o Planalto, com o líder do governo, André Moura, e com um futuro presidente da
Câmara tirado do Centrão.
A estratégia de Dilma, de Lula e do PT é adiar ao máximo
a votação final do impeachment, não para tentar reverter votos ou chegar a um
resultado surpreendente a favor dela, mas sim para manter uma excelente
plataforma para enfraquecer e minar as chances de sucesso do interino Michel
Temer.
Temer, porém, não sangra sozinho. Enquanto o Brasil tiver
dois presidentes e ainda houver dúvidas quanto à sua confirmação, por mínimas
que sejam, mais lenta e mais difícil é a recuperação da confiança, dos
investidores e, portanto, da economia – e dos empregos.
Quanto a Eduardo Cunha: seus dois problemas agora são os
prazos e suas contas com a Justiça. Ele está estrebuchando, mas tenta empurrar
o fim para agosto, aproveitando-se do início do recesso branco do Congresso na
próxima quinta-feira. E, na Justiça, ele dá murro em ponta de faca.
Sem a presidência da Câmara, seus muitos processos no
Supremo Tribunal Federal saem do plenário para uma das turmas e podem ganhar
mais celeridade. E, quando perder o mandato de deputado, ele perderá o próprio
direito a foro privilegiado. Trocando em miúdos: vai sair do Supremo e cair nas
garras do juiz Sérgio Moro, já implacáveis com sua mulher, Claudia Cruz.
Em resumo, há uma grande simbiose entre Dilma e Cunha,
mas por motivos muito diferentes e com destinos também bastante distintos.
Dilma faz o caminho de volta para Porto Alegre, de onde nunca deveria ter
saído. Cunha está com um pé na prisão, para onde já poderia ter ido há anos,
talvez décadas. Eles já são cartas fora do baralho e o Brasil quer saber como,
para onde e com que peças esse jogo vai continuar.
P.S.: Com a Olimpíada, em agosto, bilhões de pessoas
mundo afora vão estar olhando para tudo isso sem entender nada. Se nem a gente
entende...
*Publicado no Estadão.com em 08/07/2016
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